- Tudo o que foi prometido será cumprido, Sr. Noirtier? - perguntou Morrel, enquanto Avrigny interrogava com o olhar.
- Sim - respondeu Noirtier, com uma expressão de sinistra alegria.
- Jurem portanto, meus senhores - disse Villefort, juntando as mãos de Avrigny e Morrel -, jurem que terão compaixão da honra da minha casa e que me deixarão o cuidado de a vingar...
Avrigny virou-se e murmurou um «sim» muito fraco, mas Morrel arrancou a sua mão das do magistrado, precipitou-se para a cama, colou os lábios aos lábios gelados de Valentine e fugiu com o longo gemido de uma alma que se engolfa no desespero.
Dissemos que todos os criados tinham desaparecido.
O Sr. de Villefort viu-se portanto obrigado a pedir a Avrigny que se encarregasse das formalidades, tão numerosas e delicadas, que envolvem a morte nas nossas grandes cidades, e sobretudo a morte em circunstâncias tão suspeitas.
Quanto a Noirtier, era qualquer coisa terrível ver aquela dor horrível, aquele desespero sem gestos, aquelas lágrimas sem voz.
Villefort regressou ao seu gabinete e Avrigny foi buscar o médico municipal, a quem competiam as funções de inspector dos óbitos, mas que o vulgo designava com menos respeito e mais propriedade por «médico dos mortos».
Noirtier não se quis separar da neta.
Ao cabo de meia hora, o Sr. de Avrigny regressou com o colega. Tinham-se fechado as portas da rua e como o porteiro desaparecera com os outros criados, foi o próprio Villefort, que lhas abriu.
Mas deteve-se no patamar; já não tinha coragem de entrar na câmara mortuária.
Os dois médicos entraram portanto sozinhos no quarto de Valentine.
Noirtier estava junto da cama, pálido como a morta, imóvel e mudo como ela.
O médico dos mortos aproximou-se com a indiferença do homem que passa metade da vida com cadáveres, levantou o lençol que cobria a jovem e entreabriu-lhe apenas os lábios.
- Oh, a pobre pequena está bem morta! - exclamou Avrigny, suspirando. - é verdade - respondeu laconicamente o médico, deixando cair o lençol que cobria a cara de Valentine.
Noirtier emitiu um arquejo abafado.
Avrigny virou-se; os olhos do velho cintilavam. O bom doutor adivinhou que Noirtier exigia que lhe deixassem ver a neta.
Aproximou-o da cama, e enquanto o médico dos mortos mergulhava em água cloretada os dedos que tinham tocado nos lábios da defunta, descobriu o rosto pálido e calmo que parecia de um anjo adormecido.
Uma lágrima que apareceu ao canto do olho de Noirtier foi o agradecimento que recebeu o bom doutor.