O conde ficou só, e a um sinal de mão seu a carruagem avançou um pouco.
Então observou durante muito tempo, com os braços cruzados, aquele cadinho onde se fundiam, torciam e modelavam todas as ideias que brotam do abismo fervilhante para irem agitar o mundo. Depois de observar bem com o seu olhar poderoso aquela Babilónia que tanto fazia sonhar os poetas religiosos como os sarcásticos materialistas, murmurou, inclinando a cabeça e juntando as mãos, como se fosse rezar:
- Grande cidade. Há menos de seis meses que transpus as suas portas. Creio que foi o espírito de Deus que me trouxe até cá e que me permite retirar triunfante. Confiei a esse Deus, o único capaz de ler no meu coração, o segredo da minha presença dentro das tuas muralhas; só ele sabe que me retiro sem ódio e sem orgulho, mas não sem pesar; só ele sabe que não utilizei em meu proveito nem em benefício de causas vãs o poder que me confiou. ó grande cidade, foi no teu seio palpitante que encontrei o que procurava! Mineiro paciente, revolvi-te as entranhas para fazer sair o mal. Agora, a minha obra está concluída e a minha missão terminada; agora já me não podes oferecer nem alegrias nem dores.
Adeus, Paris! Adeus! O seu olhar passeou ainda sobre a vasta planície, como o de um génio nocturno. Em seguida passou a mão pela testa, voltou a subir para a carruagem, que se fechou atrás dele e desapareceu em breve do outro lado da encosta num turbilhão de pó e ruído.
Percorreram duas léguas sem pronunciar uma só palavra. Morrel sonhava, Monte-Cristo via-o sonhar.
- Morrel, está arrependido de me ter seguido?
- Não, Sr. Conde. Mas deixar Paris...
- Se soubesse que a felicidade o esperava em Paris, Morrel, tê-lo-ia deixado lá.
- É em Paris que Valentine repousa, e deixar Paris é perdê-la segunda vez.
- Maximilien - disse o conde -, os amigos que perdemos não repousam na Terra, estão sepultados no nosso coração, e foi Deus que assim o quis para que estivéssemos sempre acompanhados. Eu tenho dois amigos que me acompanham sempre assim um é aquele que me deu a vida, o outro o que me deu a inteligência. O espírito de ambos vive em mim. Consulto-os quando tenho dúvidas, e se tenho feito algum bem é aos seus conselhos que o devo. Consulte a voz do seu coração, Morrel, e pergunte-lhe se deve continuar a mostrar-me tão má cara.
- Meu amigo - respondeu Maximilien -, a voz do meu coração é muito triste e só me promete desventuras.