Quanto a ele, afirmou que precisava apenas de um bocadinho de repouso e que quando regressassem o encontrariam melhor. Os marinheiros não se fizeram demasiado rogados. Tinham fome, e o cheiro do cabrito chegava até eles e entre lobos-do-mar não se fazem muitas cerimónias.
Uma hora depois voltaram. Mas tudo o que Edmond conseguira fazer fora arrastar-se uma dezena de passos para se encostar a uma rocha musgosa. No entanto, longe de diminuírem, as dores de Dantès parece que tinham aumentado de violência. O velho patrão, obrigado a partir de manhã para ir descarregar nas fronteiras do Piemonte e da França, entre Nice e Fréjus, insistiu com Dantès para que tentasse levantar-se. O rapaz fez esforços sobre-humanos para lhe fazer a vontade, mas a cada esforço tornava a cair, a gemer e pálido.
- Tem os rins partidos - disse baixinho o patrão. - Não importa, é um bom companheiro e não devemos abandoná-lo.
Vejamos se conseguimos transportá-lo para a tartana.
Mas Dantès declarou que preferia morrer onde estava do que suportar as dores atrozes que lhe ocasionaria qualquer movimento, por mais ligeiro que fosse.
- Bom - disse o patrão - aconteça o que acontecer, ninguém dirá que deixámos sem socorro um bom companheiro. Só partiremos à tardinha.
Esta decisão surpreendeu muito os tripulantes, embora nenhum deles a desaprovasse, antes pelo contrário. O patrão era um homem muito rígido e viam-no pela primeira vez renunciar a uma empresa ou pelo menos adiar a sua execução.
Por isso Dantès não permitiu que por sua causa se cometesse tão grave infracção às regras de disciplina estabelecida abordo.
- Não - disse ao patrão -, fui imprudente e é justo que sofra as consequências da minha imprudência. Deixem-me uma pequena provisão de bolachas, uma espingarda, pólvora e balas para matar os cabritos, ou mesmo para me defender, e um enxadão para construir, se demorarem muito tempo a vir-me buscar, uma espécie de casa.
- Mas morrerás de fome - objectou o patrão.
- Prefiro assim - respondeu Edmond - a sofrer as dores inauditas que um só movimento me ocasiona.
O patrão virou-se para o lado do navio, que balouçava, com um princípio de aparelhagem, no portinho, pronto a fazer-se ao mar logo que a sua toilette estivesse concluída.
- Que havemos de fazer, maltês? - perguntou. - Não te podemos abandonar assim, mas também não podemos ficar...
- Partam, partam! - gritou Dantès.
- Estaremos pelo menos oito dias ausentes - declarou o patrão -e além disso teremos de nos desviar da nossa rota para te vir buscar.
- Escute - disse Dantès. - Se dentro de dois ou três dias encontrar algum barco de pesca ou outro que venha para estas paragens, recomende-me. Pagarei vinte e cinco piastras pelo meu regresso a Liorne. Se não encontrar nenhum barco, volte por cá.