Morrel levantou-se para ir abrir a porta, mas as forças faltaram-lhe e voltou a cair na poltrona.
Os dois homens ficaram diante um do outro. Morrel tremendo como varas verdes, o estrangeiro olhando-o com expressão de profunda compaixão. O barulho cessara, mas dir-se-ia que Morrel esperava qualquer coisa. Aquele barulho tinha uma causa e devia ter um efeito.
Pareceu ao estrangeiro que alguém subia suavemente a escada e que os passos de várias pessoas se detinham no patamar.
Foi introduzida uma chave na fechadura da primeira porta e ouviu-se essa porta chiar nos gonzos.
- Só duas pessoas têm a chave daquela porta - murmurou Morrel. - Coclès e Julie.
Ao mesmo tempo a segunda porta abriu-se e viu-se aparecer a rapariga, pálida e lavada em lágrimas.
Morrel ergueu-se muito trémulo e apoiou-se no braço da poltrona, pois de contrário não conseguiria ter-se de pé
Queria interrogar, mas não tinha voz.
- Oh, meu pai! - exclamou a jovem, juntando as mãos. - Perdoe à sua filha ser a portadora de uma má notícia! - Morrel empalideceu horrivelmente. Julie lançou-se-lhe nos braços.
- Oh, meu pai, meu pai, coragem!
- Assim, o Pharaon naufragou? - perguntou Morrel em voz estrangulada.
A rapariga não respondeu, mas fez um sinal afirmativo com a cabeça encostada ao peito do pai
- E a tripulação? - indagou Morrel.
- Salva - respondeu a jovem. - Foi salva pelo navio bordelês que acaba de entrar no porto.
Morrel levantou ambas as mãos ao céu com uma expressão de resignação e reconhecimento sublime.
- Obrigado, meu Deus! - disse Morrel. - Ao menos só a mim feris.
Por mais fleumático que fosse o inglês, nem por isso uma lágrima deixou de lhe humedecer as pálpebras.
- Entrem - disse Morrel. - Entrem, pois presumo que estão todos à porta.
Com efeito, mal pronunciou estas palavras, a Sr.ª Morrel entrou soluçando, emmanuel seguia-a. Ao fundo da antecâmara viam-se as figuras rudes de sete ou oito marinheiros seminus.
Ao ver aqueles homens, o inglês estremeceu. Deu um passo em frente como que para se lhos dirigir, mas conteve-se e ocultou-se, pelo contrário, no canto mais escuro e afastado do gabinete.
A Sr.ª Morrel foi sentar-se na poltrona e tomou uma das mãos do marido nas suas, enquanto Julie continuava encostada ao peito do pai. Emmanuel ficara a meio caminho do gabinete e parecia servir de ligação entre o grupo da família Morrel e os marinheiros que se encontravam à porta.
- Como foi que aconteceu? - perguntou Morrel.