- Aproxime-se, Penelon - disse o rapaz -, e conte como as coisas se passaram.
Um velho marinheiro bronzeado pelo sol do equador, adiantou-se rodando nas mãos os restos de um chapéu.
- Bons dias, Sr. Morrel - disse, como se tivesse saído de Marselha na véspera e chegasse de Aix ou Toulon
- Bons dias, meu amigo - respondeu o armador, sem poder deixar de sorrir apesar das lágrimas. - Mas onde está o comandante?
- O comandante, Sr. Morrel, ficou doente em Palma. Mas se Deus quiser não será nada e vê-lo-á chegar um dia destes de tão boa saúde como o senhor ou eu.
- Está bem... Agora fale, Penelon - pediu o Sr. Morrel.
Penelon passou o tabaco de mascar do lado direito para o lado esquerdo da boca, pôs a mão diante desta, virou-se, lançou na antecâmara um longo jacto de saliva negra, adiantou um pé e disse, gingando-se:
- Na altura, Sr. Morrel, encontrávamo-nos qualquer coisa como entre o cabo Branco e o cabo Bojador, navegando com uma linda brisa de su-sudoeste, depois de oito dias de calmaria, quando o comandante Gaumard se aproximou de mim, que ia ao leme, e me disse:
«- Tio Penelon, que lhe parecem aquelas nuvens que se erguem lá adiante no horizonte?
«- Eu estava precisamente naquele momento a olhar para elas.
«- Que me parecem, comandante? Parece-me que sobem um bocado mais depressa do que têm direito e que são mais negras do que conviria a nuvens que não tivessem más intenções.
«- É também a minha opinião - disse o comandante - e vou já tomar as minhas precauções. Temos demasiadas velas para o vento que não tarda a soprar... Olá? Eh? Preparar para ferrar os sobrejoanetes e içar baixo a giba!
«- Era tempo. Ainda a ordem não estava cumprida e já o vento estava sobre nós e o navio ficava de querena.
«- Demónio, ainda temos demasiado pano! - disse o comandante. - Preparar para ferrar a vela grande.
«- Cinco minutos depois a vela grande estava ferrada e navegámos com a mezena, as gáveas e os joanetes.
«- Que é isso, Tio Penelon, porque está a abanar a cabeça - perguntou-me o comandante.
«- No seu lugar não ficaria por aí...
«- Creio que tem razão, velho, vamos ter vendaval - disse ele.
«- Com a breca, comandante - respondi-lhe eu -, quem comprasse o que se passa lá adiante por um vendaval faria um rico negócio? Trata-se de uma tempestade de se lhe tirar o chapéu ou eu já não percebo nada disto!
«- Quer dizer, via-se vir o vento como se vê vir a poeira em Montredon. Felizmente tinha diante de si um homem que o conhecia.
«- Preparar para colocar dois rizes nas gáveas! - gritou o comandante. - Largar bolinas, bracear ao vento, amainar as gáveas e carregar as talhas sobre as vergas!
- Isso não era o suficiente nessas paragens - interveio o inglês. - Eu teria colocado quatro rizes e ter-me-ia desembaraçado da mezena.