Morrel voltou a cair na sua cadeira. Faltavam-lhe as forças e a sua inteligência recusava-se a classificar aquela sucessão de acontecimentos incríveis, inauditos, fabulosos.
Mas o filho entrou por seu turno.
- Pai! - gritou Maximilien. - Não dizia que o Pharaon naufragara? Pois o vigia assinalou-o, está a entrar no porto!
- Meus amigos - disse Morrel -, se isso fosse verdade, seria necessário acreditar num milagre de Deus. Impossível! Impossível! Mas o que era real e não menos incrível era aquela bolsa que tinha na mão, era aquela letra resgatada, era aquele magnífico diamante.
- Ah, senhor! - disse Coclès por seu turno. - Que significa isto? O Pharaon...
- Vamos, meus filhos - atalhou Morrel, levantando-se -, vamos ver e que Deus tenha piedade de nós se a notícia é falsa.
Desceram. A meio da escada encontraram a Sr.ª Morrel. A pobre mulher não ousava subir.
Chegaram num instante à Cannebière.
Havia muita gente no porto.
Toda ela se afastou diante de Morrel.
- O Pharaon! o Pharaon! - diziam todas aquelas vozes.
De facto, coisa maravilhosa, inaudita, diante da Torre de S. João um navio, tendo à popa estas palavras escritas em letras brancas Pharaon (Morrel & Filhos, Marselha) absolutamente idêntico ao outro Pharaon e como o outro carregado de cochonilha e índigo, ancorava e ferrava as velas. Na ponte, o comandante Gaumard dava as suas ordens e mestre Penelon fazia sinais ao Sr. Morrel.
Já não era possível duvidar: o testemunho dos sentidos estava ali e dez mil pessoas confirmavam esse testemunho.
Quando Morrel e o filho se abraçaram no molhe, perante os aplausos de toda a cidade, testemunha daquele prodígio, um homem, com o rosto semicoberto por uma barba preta e que escondido atrás da guarita de uma sentinela assistia à cena enternecido, murmurou estas palavras:
- Sê feliz, nobre coração; sê abençoado por todo o bem que fizeste e que ainda farás, e que o meu reconhecimento permaneça na sombra como o teu bem-fazer.
E com um sorriso, em que transpareciam a alegria e a felicidade, deixou o seu esconderijo e, sem que ninguém lhe prestasse atenção, de tal modo estavam todos interessados no acontecimento do dia, desceu uma dessas escadinhas que servem de cais e chamou três vezes:
- Jacopo! Jacopo! Jacopo! Então veio ao seu encontro uma chalupa, que o recebeu a bordo e o transportou para um iate ricamente aparelhado, para a coberta do qual subiu com a ligeireza de um marinheiro. Daí, olhou mais uma vez para Morrel, que chorando de alegria distribuía cordiais apertos de mão a toda a gente e agradecia com um olhar vago ao benfeitor desconhecido que parecia procurar no Céu.