Oh, claro que me bateria em duelo por tudo isso! Mas por um sofrimento lento, profundo, infinito, eterno, infligiria, se me fosse possível um sofrimento idêntico ao que me tivessem causado: olho por olho, dente por dente, como dizem os orientais, nossos mestres em todas as coisas, esses eleitos da criação que souberam criar para si uma vida de sonhos e um paraíso de realidades.
- Mas - observou Franz ao conde - com essa teoria que o constitui juiz e carrasco na sua própria causa, seria difícil que se contivesse numa medida que lhe permitisse escapar eternamente ao poder da lei. O ódio é cego, a cólera desorienta, e aquele que serve a si próprio a vingança arrisca-se a beber uma beberagem amarga.
- Sim, se é pobre e inexperiente; não, se é milionário e hábil. Aliás, o pior que lhe pode acontecer é o último suplício de que falámos há pouco, aquele que a filantrópica Revolução Francesa inventou para substituir o esquartejamento e a roda. Mas que significa o suplício se estiver vingado? Na verdade, sinto-me quase decepcionado por, segundo todas as probabilidades, esse miserável Peppino não ser decapitato, como eles dizem, pois se o fosse veriam como a execução é rápida e se realmente vale a pena perder tempo a falar a tal respeito. Mas agora reparo, meus senhores, que escolhemos uma conversa deveras singular para um dia de Carnaval. Como aconteceu tal coisa? Ah, já me lembro! Pediram-me um lugar à minha janela. Pois bem, seja, tê-lo-ão. Mas sentemo-nos primeiro à mesa, pois vêm anunciar-nos que estamos servidos.
Com efeito um criado abriu uma das quatro portas da sala e proferiu as palavras sacramentais:
- Al suo commodo! os dois jovens levantaram-se e passaram à sala de jantar.
Durante o pequeno-almoço, excelente e servido com infinito requinte, Franz procurou com a vista os olhos de Albert, a fim de ler neles a impressão que sem dúvida produzira nele as palavras do seu anfitrião. Mas quer porque na sua despreocupação habitual lhes não tivesse prestado grande atenção, quer porque a concessão que o conde de Monte-Cristo lhe fizera a propósito do duelo o tivesse reconciliado com ele, quer finalmente porque os antecedentes que relatámos, apenas conhecidos de Franz, tivessem duplicado só para si o efeito das teorias do conde, não notou que o companheiro estivesse de modo algum preocupado. Muito pelo contrário, fazia honra à refeição como homem condenado havia quatro ou cinco meses à cozinha italiana, isto é, a uma das piores cozinhas do mundo. Quanto ao conde, mal tocava em cada prato.