Dir-se-ia que ao sentar-se à mesa com os seus convivas cumpria um mero dever de cortesia e que esperava que se fossem embora para se mandar servir alguma iguaria estranha ou especial.
- Malgrado seu, o caso lembrava a Franz o terror que o conde inspirara à condessa G... e a convicção em que a deixara de que o conde, o homem que lhe mostrara no camarote fronteiro ao dela, era um vampiro.
No fim do pequeno-almoço, Franz puxou pelo relógio.
- Estão assim com tanta pressa? - perguntou-lhe o conde.
- Queira desculpar-nos, Sr. Conde - respondeu Franz -, mas temos ainda de fazer mil coisas.
- O quê?
- Não temos máscaras e hoje as máscaras são obrigatórias.
- Não percam tempo com isso. Temos, segundo creio, um quarto particular na Praça del Popolo. Mandarei levar para lá os trajes que se dignarem indicar-me e mascarar-nos-emos imediatamente.
- Depois da execução? - perguntou Franz.
- Sem dúvida. Depois, durante ou antes, como quiserem.
- Diante do cadafalso?
- O cadafalso faz parte da festa.
- Desculpe, Sr. Conde, mas pensei melhor - redarguiu Franz. - Decididamente, agradeço-lhe a sua amabilidade, mas contentar-me-ei com um lugar na sua carruagem e outro à janela do Palácio Rospoli, e deixar-lhe-ei livre, para dispor dele como entender, o meu lugar à janela da Praça del Popolo.
- Mas assim perde, previno-o, uma coisa deveras curiosa - contrapôs o conde.
- Contar-ma-á - insistiu Franz - e estou convencido de que pela sua boca o relato impressionar-me-á quase tanto como a vista. De resto, já por mais de uma vez quis assistir a uma execução e nunca fui capaz. E você, Albert?
- Eu - respondeu o visconde - vi executar Castaing. Mas creio que estava um bocadinho alegre nesse dia. Foi no dia da minha saída do colégio e tínhamos passado a noite não sei em que botequim.
- Aliás, o facto de não ter feito uma coisa em Paris não é razão para que a não faça no estrangeiro. Quando viajamos, é para nos instruirmos; quando mudamos de terra, é para ver. Lembre-se portanto da cara que fará quando lhe perguntarem: «Como são as execuções em Roma?» E tiver de responder: «Não sei.» Além disso, consta que o condenado é um refinado patife, um velhaco que matou a golpes de cão de chaminé um bom cónego que o criara como filho. Que diabo, quando se assassina um sacerdote escolhe-se arma mais conveniente do que um cão de chaminé, sobretudo quando o sacerdote é talvez nosso pai. Se viajasse por Espanha iria assistir às touradas, não é verdade? Pois bem, suponha que vamos ver uma tourada. Lembre-se dos antigos romanos do circo, das caçadas onde se matavam trezentos leões e uma centena de homens.