»Em que pensei depois de recuperar os sentidos? Pensava sempre na mesma coisa, sempre naquele cadáver de criança, que todas as noites, nos meus sonhos, saía do seio da terra e pairava por cima da cova, ameaçando-me com a vista e com o gesto. Por isso, assim que regressei a Paris informei-me. A casa não voltara a ser habitada desde que a deixámos, mas acabava de ser alugada por nove anos. Procurei o locatário, fingi ter um grande desejo de não ver passar a mãos estranhas aquela casa que pertencia ao pai e à mãe da minha mulher e ofereci uma indemnização pela renúncia ao arrendamento. Pediram-me seis mil francos, mas eu daria dez mil, daria vinte mil. Como trazia o dinheiro comigo, fiz o inquilino assinar imediatamente a rescisão. Depois, logo que me encontrei de posse desse documento tão desejado, parti a galope para Auteuil. Ninguém, desde que eu de lá saíra, entrara naquela casa.
» Eram cinco horas da tarde. Subi ao quarto vermelho e esperei pela noite.
» Ali, tudo o que dizia a mim próprio havia um ano, na minha agonia contínua, me veio à ideia de forma muito mais ameaçadora do que nunca.
» Aquele corso que me declarara a vendetta e me seguira de Nimes a Paris; aquele corso, que se encontrava escondido no jardim e me ferira, vira-me abrir a cova, vira-me enterrar a criança e poderia acabar por descobrir quem era a senhora. Talvez até já a conhecesse... Não a faria pagar um dia o segredo do terrível acontecimento?... Não seria isso para ele uma, agradável vingança, quando soubesse que eu não morrera da sua punhalada?