- Agora que tenho esta carta - disse Villefort, guardando-a cuidadosamente na carteira - preciso doutra.
- Para quem?
- Para o rei
- Para o rei?
- Sim.
- Mas não me atrevo a escrever assim a Sua Majestade.
- Por isso, não é ao senhor que a peço, mas encarrego-o de a pedir ao Sr. de Salvieux. É necessário que me dê uma carta com o auxílio da qual possa penetrar até junto de Sua Majestade sem ser submetido a todas as formalidades de pedido de audiência que me podem fazer perder um tempo precioso.
- Mas não tem o ministro da Justiça, que entra quando quer nas Tulherias e por intermédio do qual poderá, de dia e de noite, chegar junto do rei?
- Tenho, sem dúvida, mas para quê partilhar com outro o mérito da notícia de que sou portador? Compreende o que quero dizer? O ministro relegar-me-ia muito naturalmente para segundo plano e privar-me-ia de todo o proveito no caso. Só lhe digo uma coisa, marquês: a minha carreira estará assegurada se conseguir ser o primeiro a chegar às Tulherias, porque prestarei ao rei um serviço que lhe não será permitido esquecer.
- Nesse caso, meu caro, vá fazer as malas. Entretanto, chamarei Salvieux e pedir-lhe-ei que escreva a carta que deverá servir-lhe de salvo-conduto.
- Bom, não perca tempo, pois dentro de um quarto de hora tenho de tomar a sege de posta.
- Mande parar a carruagem diante da porta.
- Sem dúvida nenhuma... Desculpar-me-á junto da marquesa, não é verdade? E também junto de Mademoiselle de Saint-Méran, que deixo num dia como este com bem profundo pesar.
- Encontrará ambas no meu gabinete e poderá despedir-se delas.
- Mil vezes obrigado. Trate da minha carta.
O marquês tocou. Apareceu um lacaio.
- Diga ao conde Salvieux que o espero... Vá agora - continuou o marquês dirigindo-se a Villefort
- Bom, é só o tempo de ir e vir.
E Villefort saiu a correr. Mas à porta pensou que um substituto do procurador régio que fosse visto a caminhar em passos precipitados se arriscaria a perturbar o repouso de toda acidade. Retomou portanto o seu passo normal já de si solene. À sua porta distinguiu na sombra como que um branco fantasma que o esperasse de pé e imóvel.
Era a bela rapariga catalã que, não tendo notícias de Edmond, esgueirara-se ao cair da noite do Pharo para vir saber pessoalmente o motivo da prisão do seu amado.
Ao aproximar-se Villefort, afastou-se da parede a que se encostava e veio cortar-lhe o caminho. Dantès falara da noiva ao substituto e Mercédès não teve necessidade de se apresentar para que Villefort a reconhecesse. Ficou surpreendido com a dignidade daquela mulher e quando ela lhe perguntou que era feito do seu amado pareceu-lhe ser ele o acusado e ela o juiz.