- Mais uma vez me desespera, Maximilien! - redarguiu Valentine. - Mais uma vez revolve o punhal na chaga? Diga-me, que faria se a sua irmã escutasse um conselho como o que acaba de me dar?
- Menina - respondeu Morrel, com um sorriso amargo. - Sou um egoísta, como disse, e na minha qualidade de egoísta não penso no que fariam os outros na minha posição, mas sim no que conto fazer eu. Penso que a conheço há um ano e que, desde o dia em que a conheci, depositei todas as minhas oportunidades de felicidade no seu amor; que chegou um dia em que me disse que me amava; que nesse dia colocaria todas as minhas esperanças de futuro na sua posse. Era a minha vida. Agora não penso em mais nada; digo apenas para comigo que a sorte mudou, que esperava ganhar o Céu e o perdi. Isto acontece todos os dias, quando um jogador perde não só o que tem, mas também o que não tem.
Morrel pronunciou estas palavras com uma calma perfeita.
Valentine fitou-o um instante com os seus grandes olhos perscrutadores, procurando não deixar que os de Morrel penetrassem até à agitação que lhe turbilhonava já no fundo do coração.
- Mas enfim, que vai fazer? - perguntou Valentine.
- Vou ter a honra de lhe dizer adeus, menina, tomando como testemunha Deus, que escuta as minhas palavras e lê no fundo do meu coração, de que lhe desejo uma vida bastante calma, bastante feliz e bastante cheia para que nela não haja lugar para a minha recordação.
- Oh! - murmurou Valentine.
- Adeus, Valentine, adeus! - disse Morrel, inclinando-se.
- Aonde vai? - gritou ela, estendendo a mão através das grades e agarrando Maximilien pela sobrecasaca, pois compreendia pela sua agitação interior que a calma do seu apaixonado não podia ser verdadeira. - Aonde vai?
- Vou providenciar para não trazer nova perturbação à sua família e dar um exemplo que poderão seguir todos os homens honestos e dedicados que se encontrarem na minha situação.
- Antes de me deixar, diga-me o que vai fazer, Maximilien
O jovem sorriu tristemente.
- Oh, fale, fale, suplico-lhe! - pediu Valentine.
- A sua resolução mudou, Valentine?
- Não pode mudar, infeliz! Sabe isso muito bem! - gritou a jovem.
- Então, adeus, Valentine! Valentine abanou o portão com uma força de que ninguém a julgaria capaz. E como Morrel se afastasse, passou as mãos através das grades e juntou-as, torcendo os braços.
- Que vai fazer? Quero saber! - gritou. - Aonde vai?
- Oh, esteja tranquila! - respondeu Maximilien, parando a três passos do portão. - Não tenho intenção de tornar outro homem responsável pelos rigores que o destino me reserva.