Morrel arriscou-se a chamar e pareceu-lhe que o vento lhe trazia um gemido inarticulado.
Por fim, deram dez e meia. Era-lhe impossível conter-se mais tempo; todas as hipóteses eram admissíveis. As têmporas de Maximilien latejavam com força e passavam-lhe nuvens diante dos olhos. Encavalitou-se no muro e saltou para o outro lado.
Estava em casa de Villefort, onde acabava de entrar por escalamento. Lembrou-se das consequências que lhe poderia acarretar semelhante procedimento, mas não viera até ali para recuar.
Num instante encontrou-se na extremidade do maciço. Do ponto onde estava via-se a casa.
Então, Morrel assegurou-se de uma coisa de que já suspeitara ao tentar ver através das árvores: em lugar das luzes que pensava ver brilhar em cada janela, como é natural nos dias de cerimónia, só viu a massa cinzenta do edifício, velada ainda por uma grande cortina de sombra projectada por uma nuvem imensa que tapava a Lua.
De vez em quando, como que transviada, passava a correr uma luz diante de três janelas do primeiro andar. Essas três janelas eram as dos aposentos da Sr.ª de Saint-Méran.
Outra luz permanecia imóvel atrás dos cortinados vermelhos do quarto da Sr.ª de Villefort.
Morrel adivinhou tudo isto. Tantas vezes, para acompanhar Valentine em pensamento a qualquer hora do dia, esboçara a planta da casa, que a conhecia sem a ter visto.
O rapaz ficou ainda mais assustado com aquela escuridão e aquele silêncio do que ficara com a ausência de Valentine.
Desorientado, louco de dor, decidido a arriscar tudo para tornar a ver Valentine e assegurar-se da desgraça que pressentia, fosse qual fosse, Morrel alcançou a orla do maciço e preparava-se para atravessar o mais rapidamente possível o jardim, em campo aberto, quando um som de vozes ainda bastante afastado, mas que o vento lhe trazia, chegou até si.
Ao ouvir tal barulho, recuou um passo; já meio saído da folhagem, embrenhou-se nela completamente e ficou imóvel e calado, mergulhado na obscuridade.
A sua resolução estava tomada: se fosse Valentine, sozinha, avisá-la-ia com uma palavra à sua passagem; se Valentine estivesse acompanhada, pelo menos vê-la-ia e assegurar-se-ia de que não lhe acontecera nenhum mal; se fossem estranhos, apanharia algumas palavras do seu diálogo, que talvez lhe permitissem compreender aquele mistério, até ali incompreensível.