O velho sorriu com os olhos, como tinha o hábito de sorrir quando lhe falavam do Céu. Ficara sempre um bocadinho de ateísmo nas ideias do velho jacobino.
- Do acaso? - insistiu Morrel.
- Não.
- Do senhor?
- Sim.
- Do senhor?...
- Sim - repetiu o velho.
- Compreende bem o que lhe peço, senhor? Desculpe a minha insistência, porque a minha vida está na sua resposta: a nossa salvação vir-nos-á do senhor?
- Sim.
- Tem a certeza?
- Tenho.
- Assume essa responsabilidade?
- Assumo.
E havia no olhar que fazia esta afirmação tal firmeza que não era possível duvidar quer da sua vontade, quer da sua força.
- Oh, obrigado, senhor, obrigado cem vezes! Mas como, a não ser que um milagre do Senhor lhe restitua a palavra, o gesto, o movimento, como poderá, preso a essa poltrona, mudo e imóvel, como poderá opor-se ao casamento?
Um sorriso iluminou o rosto do velho, sorriso estranho como o daqueles olhos numa fisionomia imóvel.
- Portanto, devo esperar? - perguntou o rapaz.
- Deve.
- Mas o contrato?
Reapareceu o mesmo sorriso.
- Quer dizer que não será assinado?
- Quero - respondeu Noirtier.
- Assim, o contrato não será mesmo assinado! - exclamou Morrel. - Oh, desculpe, senhor! Quando nos anunciam uma grande felicidade, é legítimo duvidar. O contrato não será assinado?...
- Não - respondeu o paralítico.
Apesar desta segurança, Morrel hesitava em acreditar.
Aquela promessa de um velho impotente era tão estranha que em vez de provir de uma força de vontade podia emanar de um enfraquecimento de órgãos. Não é natural que o insensato que ignora a sua loucura pretenda realizar coisas superiores às suas forças?
O fraco fala dos pesos que levanta, o tímido, dos gigantes que enfrenta, o pobre dos tesouros que maneja, o mais humilde camponês, no cúmulo do seu orgulho, julga-se Júpiter.
Quer porque Noirtier tivesse adivinhado a indecisão do rapaz, quer porque não confiasse completamente na docilidade que mostrara, olhou-o fixamente.
- Que deseja, senhor? - perguntou Morrel. - Que lhe renove a minha promessa de nada fazer?
O olhar de Noirtier permaneceu fixo e firme, como se quisesse dizer que lhe não bastava uma promessa. Depois passou da cara para a mão.
- Quer que jure, senhor? - perguntou Maximilien.
- Quero - respondeu o paralítico com a mesma solenidade. Quero.
Morrel compreendeu que o velho atribuía grande importância ao juramento. Estendeu a mão.
- Juro-lhe pela minha honra - disse - esperar o que decidir para agir contra o Sr. de Epinay.