- Nem eu - respondeu a Sr.ª Danglars, com uma presença de espírito admirável. - Mas o senhor começou uma frase que ficou inacabada.
- Qual?
- Afirmava que o Sr. Debray lhe dissera...
- Ah, é verdade? O Sr. Debray disse-me que era a senhora que sacrificava ao demónio do jogo.
- Tive esse gosto durante algum tempo, confesso, mas já o não tenho - declarou a Sr.ª Danglars.
- Pois faz mal, minha senhora. Meu Deus, as oportunidades da fortuna são tão precárias que se eu fosse mulher - e o acaso me tivesse tornado esposa de um banqueiro, por mais confiança que depositasse na sorte do meu marido (porque em especulação, como sabe, é tudo sorte e azar), repito; por mais confiança que depositasse na sorte do meu marido, começaria sempre por me garantir uma fortuna independente, ainda que para adquirir essa fortuna tivesse de confiar os meus interesses a mãos que lhe fossem desconhecidas.
A Sr.ª Danglars corou, a seu pesar.
- Olhe - prosseguiu Monte-Cristo, como se não tivesse visto nada -, fala-se de um bom golpe dado ontem com títulos de Nápoles.
- Não tenho - respondeu vivamente a baronesa -, nem nunca os tive. Mas parece-me que já falámos o suficiente de Bolsa, Sr. Conde. Parecemos dois correctores... Falemos um pouco dos pobres Villeforts, tão perseguidos neste momento pela fatalidade.
- Que lhes aconteceu? - perguntou Monte-Cristo com perfeita ingenuidade.
- Então não sabe? Depois de perderem o Sr. de Saint-Méran, três ou quatro dias depois da sua partida, acabam de perder a marquesa, três ou quatro dias depois da sua chegada.
- Ah, é verdade, soube disso! - declarou Monte-Cristo. - Mas como diz Clódio a Hamlet, trata-se de uma lei da natureza: os seus pais morreram antes deles e eles choraram-nos; eles morrerão antes dos seus filhos e os seus filhos chorá-los-ão.
- Mas isso não é tudo.
- Como não é tudo?
- Não. Como sabe, iam casar a filha...
- Com o Sr. Franz de Epinay... Desfizeram o casamento?
- Ontem de manhã, ao que parece, Franz restituiu-lhes a sua palavra.
- Deveras?... E conhecem-se as causas desse rompimento?
- Não.
- Que notícias me dá, meu Deus! A Sr.ª e o Sr. de Villefort como aceitaram todas essas desgraças?
- Como sempre, com filosofia.
Neste momento, Danglars voltou a entrar, sozinho.
- Então deixou o Sr. Cavalcanti com a sua filha? - observou a baronesa.
- E Mademoiselle de Armilly não é ninguém? - replicou o banqueiro.
Depois, virando-se para Monte-Cristo:
- Encantador rapaz, não é verdade? Refiro-me ao príncipe Cavalcanti... Mas ele é mesmo príncipe?