- Mas a menina - atalhou Morrel -, a menina que é tão querida e necessária ao Sr. Noirtier?
- Eu - respondeu Valentine - não deixarei o meu avô. É ponto assente entre nós. O meu quarto será junto do seu. Ou terei o consentimento do Sr. de Villefort para ir morar com o avo Noirtier ou não terei. No primeiro caso, sairei daqui em qualquer momento a partir de agora; no segundo, esperarei pela minha maioridade, que será daqui a dezoito meses. Então serei livre, terei uma fortuna independente e...
- E?... - perguntou Morrel.
- E, com a autorização do meu avô, cumprirei a promessa que lhe fiz, Sr. Morrel.
Valentine pronunciou as últimas palavras tão baixo que Morrel as não teria ouvido sem o interesse que tinha em as devorar.
- Exprimi o seu pensamento, avô? - acrescentou Valentine, dirigindo-se a Noirtier.
- Sim - respondeu o velho.
- Uma vez em casa do meu avô - prosseguiu Valentine -, o Sr. Morrel poderá ver-me na presença deste bom e digno protector.
Se os laços que os nossos corações, talvez ignorantes ou caprichosos, começaram a dar parecerem convenientes e oferecerem garantias de felicidade futura à nossa experiência (infelizmente, diz-se, os corações estimulados pelos obstáculos estriam na segurança!... ), então o Sr. Morrel poderá pedir-me a mim mesma e eu esperá-lo-ei.
- Oh! - exclamou Morrel, tentado a ajoelhar diante do velho como diante de Deus, diante de Valentine como diante de um anjo. - Oh, que fiz eu de bem na minha vida para merecer tanta felicidade?!
- Até lá - continuou a jovem, na sua voz pura e severa - respeitaremos as conveniências e a própria vontade das nossas famílias, desde que essa vontade não queira separar-nos para sempre. Numa palavra, e repito esta palavra porque ela diz tudo: esperaremos.
- E os sacrifícios que essa palavra impõe, senhor - disse Morrel -, juro-lhe que os cumprirei, não com resignação, mas sim com felicidade.
- Assim - continuou Valentine com um olhar muito doce ao coração de Maximilien -, nada de imprudências, meu amigo; não comprometa aquela que, a partir de hoje, se considera destinada a usar pura e dignamente o seu nome. Morrel pôs a mão no coração.
Entretanto, Noirtier olhava ambos com ternura. Barrois, que ficara ao fundo como um homem a quem nada se oculta, sorria limpando as grossas gotas de suor que lhe caíam da calva.
- Oh, meu Deus, como está com calor o nosso bom Barrois! exclamou Valentine.
- Se soubesse o que corri, menina... - redarguiu Barrois. - Mas o Sr. Morrel, devo fazer-lhe essa justiça, corria ainda mais do que eu.
Noirtier indicou com a vista uma bandeja em que estavam uma garrafa de limonada e um copo.