O Conde de Monte Cristo - Cap. 81: O quarto do padeiro reformado Pág. 780 / 1080

- Não me chateies! - redarguiu Andrea, entrando.

E atirou adiante de si o barrete da libré, que, falhando a cadeira, caiu no chão e deu a volta ao quarto rolando sobre a sua circunferência.

- Vamos, vamos, não te zangues, pequeno! - aconselhou Caderousse. - Repara como pensei em ti. Já viste o bom pequeno-almoço que nos espera? Só coisas de que gostas, meu finório! De facto, Andrea notou no ar um cheiro a cozinha cujos aromas grosseiros não deixavam de possuir certo encanto para o seu estômago faminto: primeiro, a mistura de gordura fresca e alho que marca a cozinha provençal de ordem inferior; depois, um cheiro a peixe gratinado e sobretudo o perfume intenso da noz-moscada e do cravinho. Todos estes cheiros provinham de duas travessas fundas e cobertas, colocadas em cima de dois fornilhos, e de uma caçarola que rechinava no forno de um fogão de ferro fundido.

Na divisão contígua, Andrea viu, além de uma mesa bastante limpa e adornada com dois talheres, duas garrafas de vinho seladas, uma de verde e a outra de amarelo, uma boa quantidade de aguardente numa outra garrafa e uma macedónia de frutas numa grande folha de couve colocada com arte num prato de faiança.

- Que te parece, pequeno? - perguntou Caderousse. - Como isto cheira bem! Mas não admira, como sabes, era um bom cozinheiro lá... naquele sítio! Lembras-te como lambiam os dedos com os meus cozinhados? E tu eras sempre o primeiro a saborear os meus molhos, e olha que lhe não torcias o nariz!...

E Caderousse pôs-se a descascar um suplemento de cebolas.

- Está bem, está - redarguiu Andrea, irritado. - Com a breca, se foi para tomar o pequeno-almoço contigo que me incomodaste, que o Diabo te leve!

- Meu filho, enquanto se come, conversa-se – redarguiu sentenciosamente Caderousse.

- E depois, grande ingrato, não tens prazer em ver um bocadinho o teu amigo? Pois eu choro de alegria.

Com efeito, Caderousse chorava realmente. Só que seria difícil dizer se era a alegria ou se eram as cebolas que agiam sobre a glândula lacrimal do antigo estalajadeiro da Pont-du-Gard.

- Cala-te, hipócrita. Meu amigo, tu?...

- Sim, sou teu amigo, diabos me levem! É uma fraqueza, bem sei, mas é mais forte do que eu... - confessou Caderousse.

- O que não te impede de me teres feito cá vir para qualquer perfídia...

- Então, então!... - exclamou Caderousse, limpando uma grande faca ao avental. - Se não fosse teu amigo, suportaria a vida miserável que me proporcionas? Olha bem: vestes a libré do teu criado, prova de que tens um criado; pois eu não tenho e sou obrigado a descascar eu próprio os meus legumes.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069