O Conde de Monte Cristo - Cap. 85: A viagem Pág. 817 / 1080

Ali, o filho do deserto, encontrava-se no seu elemento, e com o seu rosto negro, os seus olhos ardentes e o seu albornoz cor de neve, parecia, no meio da poeira que levantava, o génio do sim um e o deus do furacão.

- Aí está uma volúpia que não conhecia, a volúpia da velocidade - declarou Morcerf.

E as últimas nuvens da sua fronte dissipavam-se, como se o ar que fendia levasse essas nuvens consigo.

- Mas onde diabo arranja o senhor semelhantes cavalos? - perguntou Albert. - Manda-os fazer de encomenda?

- Exactamente - respondeu o conde. - Há seis anos, encontrei na Hungria um garanhão famoso pela sua velocidade. Comprei-o, já não me lembro por quanto; foi Bertuccio quem o pagou. No mesmo ano, ele teve trinta e dois filhos. É toda essa progenitura do mesmo pai que vamos passar em revista. São todos iguais: negros, sem uma única malha, excepto uma estrela na testa, porque por esse privilégio da coudelaria se escolheram as éguas, tal como para os paxás se escolhem as favoritas.

- É admirável! ... Mas diga-me, conde, que faz o senhor com todos esses cavalos? - O que vê: viajo com eles.

- Mas decerto não viajará sempre...

- Quando me não forem mais necessários, Bertuccio vendê-los-á e pretende que ganhará trinta ou quarenta mil francos no negócio.

- Mas não haverá rei na Europa suficientemente rico para lhos comprar.

- Então, vendê-los-á a qualquer simples vizir do Oriente, que esvaziará o seu tesouro para os pagar e o voltará a encher vergustando as plantas dos pés dos seus súbditos.

- Conde, posso comunicar-lhe uma ideia que me ocorreu?

- Diga.

- É que, depois do senhor, Bertuccio deve ser o mais rico particular da Europa.

- Engana-se, visconde. Tenho a certeza de que se virar do avesso as algibeiras de Bertuccio não encontrará nelas nem um chavo.

- Porquê? - perguntou o jovem. - É algum fenómeno o Sr. Bertuccio? Ah. meu caro conde, não leve demasiado longe o maravilhoso ou deixarei de o acreditar, previno-o!

- O maravilhoso nunca me acompanha, Albert; trata-se apenas de uma questão de números e de bom senso. Ora atente neste dilema: um intendente rouba; mas rouba porquê?

- Demónio, porque isso lhe está na massa do sangue, parece-me! -respondeu Albert. - Rouba por roubar.

- Não, está enganado. Rouba porque tem uma mulher, filhos, desejos ambiciosos para ele e para a sua família; rouba sobretudo porque não tem a certeza de nunca deixar o patrão e porque quer garantir o futuro. Pois bem, o Sr. Bertuccio está sozinho no mundo; serve-se da minha bolsa sem me dar satisfações e tem a certeza de que nunca me deixará

- Porquê?

- Porque eu não encontraria um melhor do que ele.

- O senhor gira num círculo vicioso, o das probabilidades.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069