- Mas quem os informou tão bem? - perguntou. - Porque o meu jornal, que levantou a lebre, viu-se obrigado a abster-se por falta de provas, e no entanto temos mais interesse do que vocês em denunciar o Sr. de Morcerf, que é par de França, enquanto nós estamos na oposição.
- Oh, meu Deus, é muito simples! Não corremos atrás do escândalo; ele é que veio ao nosso encontro. Ontem chegou-nos um homem de Janina, trazendo consigo o formidável processo e, como hesitássemos em nos lançar no caminho da acusação, anunciou-nos que, se recusássemos, o artigo seria publicado noutro jornal. Você sabe, Beauchamp, o que é uma notícia importante; não quisemos perder essa. Agora os dados estão jogados; o caso é terrível e repercutir-se-á até aos confins da Europa.
Beauchamp compreendeu que a única coisa a fazer era dar-se por vencido e saiu precipitadamente para enviar um mensageiro a Morcerf.
Mas o que não pudera mandar dizer a Albert, pois o que vamos contar aconteceu depois da partida do seu mensageiro, fora que no mesmo dia se manifestara grande agitação na Câmara dos Pares, agitação que se apoderara por completo dos grupos, habitualmente tão calmos, da alta assembleia. Todos tinham chegado quase antes da hora e falavam do sinistro acontecimento que iria ocupar a atenção pública e fixá-la num dos membros mais conhecidos da ilustre corporação.
Lia-se em voz baixa o artigo e trocavam-se comentários e recordações, que precisavam ainda mais os factos. O conde de Morcerf não era estimado pelos seus colegas. Como todos os arrivistas, vira-se obrigado, para se manter na sua posição, a observar um excesso de altivez. Os grandes aristocratas riam-se dele; os talentos da república, as glórias puras, desprezavam-no instintivamente. O conde encontrava-se na situação desagradável de bode expiatório. Uma vez designado pelo dedo do Senhor para o sacrifício, todos se preparavam para lhe cair em cima.
O único que não sabia de nada era o conde de Morcerf. Não recebia o jornal onde vinha a notícia difamatória e passara a manhã a escrever cartas e a experimentar um cavalo.
Chegou portanto à hora habitual, de cabeça erguida, olhar altivo e atitude insolente, desceu da carruagem, percorreu os corredores e entrou na sala sem notar as hesitações dos contínuos e os meios cumprimentos dos colegas.
Quando Morcerf entrou, a sessão estava já aberta havia mais de meia hora.
Embora o conde, ignorando, como dissemos, tudo o que se passara, em nada tivesse modificado o seu ar e a sua atitude, tanto um como a outra pareceram a todos mais orgulhosos do que de costume, e a sua presença naquela ocasião de tal modo agressiva à assembleia, ciosa da sua honra, que todos viram nisso uma inconveniência, vários uma bravata e alguns um insulto.