Aturdido, espantado, com os olhos injectados de sangue, Albert deu dois passos atrás. Morrel aproveitou para fechar a porta.
Monte-Cristo voltou a pegar no binóculo e pôs-se a observar a sala como se nada de extraordinário se tivesse passado.
Aquele homem tinha um coração de bronze e um rosto de mármore. Morrel inclinou-se-lhe ao ouvido.
- Que lhe fez? - inquiriu.
- Eu? Nada, pelo menos pessoalmente - respondeu Monte-Cristo.
- Contudo, esta cena estranha deve ter uma causa...
- A aventura do conde de Morcerf exasperou o pobre rapaz.
- E o senhor teve alguma coisa a ver com isso?
- Foi por intermédio de Haydée que a Câmara teve conhecimento da traição do pai.
- De facto, disseram-me, mas não quis acreditar, que a escrava grega que tenho visto consigo neste mesmo camarote era filha de Ali-Paxá.
- No entanto, é verdade.
- Oh, meu Deus, compreendo tudo agora! - exclamou Morrel. - Esta cena foi premeditada.
- Como?
- Sim. Albert escreveu-me a pedir-me que estivesse esta noite na ópera. Era para me tornar testemunha do insulto que lhe queria fazer.
- Provavelmente - admitiu Monte-Cristo, com a sua imperturbável tranquilidade.
- Mas que fará dele?
- De quem?
- De Albert!
- De Albert? - repetiu Monte-Cristo no mesmo tom. - Que farei de Albert, Maximilien? Tão certo como o senhor estar aqui e eu apertar-lhe a mão, matá-lo-ei amanhã antes das dez horas da manhã. Aqui tem o que farei dele.
Morrel pegou por sua vez na mão de Monte-Cristo com as suas e estremeceu ao sentir aquela mão fria e calma.
- Ah, conde, o pai ama-o tanto!... - murmurou.
- Não me diga isso! - gritou Monte-Cristo, no primeiro movimento de cólera que deixava transparecer. - Fá-lo-ei sofrer!
Morrel, estupefacto, deixou cair a mão de Monte-Cristo.
- Conde! Conde!
- Meu caro Maximilien - interrompeu-o o conde -, escute de que forma adorável Duprez canta esta frase: «Ó Matilde, ídolo da minha alma!» Fui o primeiro a descobrir Duprez em Nápoles e o primeiro a aplaudi-lo. Bravo! Bravo!
Morrel compreendeu que não havia mais nada a dizer e calou-se. O pano, que subira no fim da cena de Albert, desceu quase imediatamente. Bateram à porta.
- Entre - disse Monte-Cristo, sem que a sua voz denotasse a menor emoção.
Apareceu Beauchamp.
- Senhor - disse a Monte-Cristo -, há pouco acompanhava, como deve ter visto, o Sr. de Morcerf.
- O que significa - redarguiu Monte-Cristo, rindo - que vinham provavelmente de jantar juntos. Ainda bem, Sr. Beauchamp, que está mais sóbrio do que ele.