O Conde de Monte Cristo - Cap. 92: O suicídio Pág. 877 / 1080

Voltou assim, terrível, implacável, caminhando de braços cruzados ao encontro do general, que não compreendera a que se devera o seu desaparecimento, que o esperava e que, sentindo os dentes entrechocarem-se-lhe e as pernas vergarem-se-lhe debaixo do corpo, recuou um passo e só se deteve quando encontrou numa mesa um ponto de apoio para a sua mão crispada.

- Fernand! - gritou-lhe Monte-Cristo. - Dos meus cem nomes, bastar-me-ia dizer-te um só para te fulminar. Mas tu adivinhas esse nome, não é verdade? Ou antes, recorda-lo. Porque apesar de todos os meus desgostos, de todas as minhas torturas, mostro-te hoje uma cara que o prazer da vingança rejuvenesce, uma cara que deves ter visto muitas vezes nos teus sonhos depois do teu casamento... com Mercédès, minha noiva! Com a cabeça inclinada para trás, as mãos estendidas e o olhar fixo, o general assistiu em silêncio ao espectáculo.

Depois, procurou o apoio da parede e deslizou lentamente até à porta, pela qual saiu às arrecuas, deixando escapar apenas este grito lúgubre, lamentoso, dilacerante:

- Edmond Dantès! Em seguida, com suspiros que não tinham nada de humanos, arrastou-se até ao peristilo da casa, atravessou o pátio como um ébrio e caiu nos braços do seu criado de quarto, murmurando apenas em voz ininteligível:

- Para o palácio! Para o palácio!

Pelo caminho, o ar fresco e a vergonha que lhe causava a atenção das pessoas puseram-no em estado de coordenar ideias.

Mas o trajecto foi curto e, à medida que se aproximava de casa, o conde sentia renovarem-se todos os seus sofrimentos.

A poucos passos de casa, o conde mandou parar e apeou-se.

A porta do palácio estava escancarada. Um fiacre, cujo cocheiro ficara muito surpreendido por ser chamado àquela magnífica mansão, estava parado no meio do pátio. O conde olhou o fiacre com terror, mas não ousou interrogar ninguém e correu para os seus aposentos.

Duas pessoas desceram a escada e só teve tempo de se esconder num gabinete para as evitar.

Era Mercédès, apoiada no braço do filho; ambos deixavam o palácio.

Passaram a curta distância do desventurado, que, oculto atrás do reposteiro de damasco, foi mesmo assim aflorado pelo vestido de seda de Mercédès e sentiu no rosto o hálito tépido destas palavras pronunciadas pelo filho:

- Coragem, minha mãe! Venha, venha, aqui já não é a nossa casa.

As palavras extinguiram-se e os passos afastaram-se.

O general endireitou-se, suspenso pelas mãos crispadas no reposteiro de damasco. Comprimia o mais horrível soluço jamais saído do peito de um pai, abandonado simultaneamente pela mulher e pelo filho.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069