- Mas então toda essa vergonha do pai recai sobre o filho? - perguntou timidamente Valentine. - O Sr. Albert parece-me completamente inocente de todas essas traições do general.
- Perdão, querida amiga - atalhou a implacável Eugénie mas o Sr. Albert reclamou e merece a sua parte nessas traições.
Parece que depois de ter provocado ontem o Sr. de Monte-Cristo na ópera lhe apresentou hoje desculpas no campo da honra.
- Impossível! - exclamou a Sr.ª de Villefort.
- Ah, querida amiga - interveio a Sr.ª Danglars com a mesma ingenuidade que já lhe apontamos -, é absolutamente verdade! Soube-o pelo Sr. Debray, que assistiu à explicação.
Valentine também conhecia a verdade, mas não se pronunciou.
Atraída por uma palavra às suas recordações, encontrava-se em pensamento no quarto de Noirtier, onde a esperava Maximilien.
Absorta nessa espécie de contemplação íntima, Valentine havia um instante que deixara de tomar parte na conversa; ser-lhe-ia até impossível repetir o que fora dito nos últimos minutos, quando de súbito a mão da Sr.ª Danglars, apoiando-se no seu braço, a tirou do seu devaneio.
- Que disse, minha senhora? - perguntou Valentine, estremecendo ao contacto dos dedos da Sr.ª Danglars como estremeceria a um contacto eléctrico.
- Disse, minha querida Valentine, que decerto não está bem...
- Eu? - redarguiu a jovem, passando a mão pela testa escaldante.
- Sim. Veja-se naquele espelho. Corou e empalideceu sucessivamente três ou quatro vezes no espaço de um minuto.
- De facto, estás muito pálida! - exclamou Eugénie.
- Oh, não te preocupes, Eugénie! Ando assim há uns dias.
E por menos experiente que fosse, a jovem compreendeu que era ocasião de sair. Aliás, a Sr.ª de Villefort veio em seu auxílio.
- Retire-se, Valentine - disse. - Está realmente doente e estas senhoras dignar-se-ão desculpá-la. Beba um copo de água pura e ficará melhor.
Valentine beijou Eugénie, cumprimentou a Sr.ª Danglars, já levantada para se retirar, e saiu.
- Esta pobre criança - disse a Sr.ª de Villefort depois de Valentine sair - preocupa-me seriamente e não me admiraria nada se lhe acontecesse algum acidente grave.
Entretanto, Valentine, numa espécie de exaltação de que se não dava conta, atravessara o quarto de Édouard sem responder a não sei que travessura do garoto e, através do seu quarto, chegara à escadinha. Descera todos os degraus, excepto os três últimos, e ouvia já a voz de Morrel quando de súbito lhe passou uma nuvem pelos olhos, o seu pé hirto falhou o degrau, as suas mãos não tiveram força para se agarrar ao corrimão e, roçando pela parede, rolou, mais do que desceu, do cimo dos três últimos degraus.