Danglars, vendo a filha sorridente e orgulhosa até à insolência, não pôde reprimir um gesto de brutalidade, acompanhado de alguns berros, mas mais nada. Debaixo do olhar interrogador da filha, diante daquele belo sobrolho negro, franzido pela interrogação, virou-se com prudência e acalmou-se imediatamente, domado pela mão de ferro da circunspecção.
- De facto, minha filha - respondeu com um sorriso -, és tudo o que te gabas de ser, excepto uma única coisa, minha filha. Não quero porém dizer-te qual demasiado bruscamente; prefiro deixar-te adivinha-la...
Eugénie olhou Danglars, muito surpreendida por lhe contestarem um dos florões da coroa de orgulho que acabava de colocar tão soberbamente na cabeça.
- Minha filha - continuou o banqueiro -, explicaste-me perfeitamente quais eram os sentimentos que presidiam às resoluções de uma jovem como tu quando decidia não se casar. Agora é a altura de te dizer quais são os motivos de um pai como eu quando decide que a filha se casará.
Eugénie inclinou-se, não como filha submissa que escuta, mas sim como adversária prestes a discutir que espera.
- Minha filha - prosseguiu Danglars -, quando um pai pede à filha que tome marido, tem sempre um motivo qualquer para desejar o casamento. Uns são dominados pela mania a que te referias há pouco, ou seja, a verem-se reviver nos netos. Não tenho essa fraqueza, começo por te dizer, pois as alegrias da família são-me quase indiferentes. Creio que posso confessar isto a uma filha que sei ser bastante filósofa para compreender esta indiferença e não a considerar um crime.
- Com certeza - declarou Eugénie. - Falemos com franqueza, senhor, prefiro isso.
- Oh, bem vês que, sem compartilhar, de modo geral, a tua simpatia pela franqueza, me submeto a ela quando creio que as circunstâncias a tal me convidam! - redarguiu Danglars. - Continuo, portanto.