O Conde de Monte Cristo - Cap. 98: A estalagem do sino e da garrafa Pág. 922 / 1080

De súbito, respondeu a si mesmo com a lógica que o leitor já lhe deve ter notado: «Um gendarme não tem nada de extraordinário numa estalagem. Em todo o caso, vistamo-nos...»

E o jovem vestiu-se com uma rapidez que não conseguira fazer-lhe perder o seu criado de quarto durante os poucos meses de vida social que levara em Paris.

- Bom - disse Andrea enquanto se vestia. - esperarei que se vá embora e quando se for embora, escapar-me-ei.

E ditas estas palavras, Andrea, já calçado e engravatado, aproximou-se devagarinho da janela e soergueu pela segunda vez a cortina de musselina.

Não só o primeiro gendarme se não fora embora, como ainda surgiu aos olhos do jovem segundo uniforme azul, amarelo e branco, ao fundo da escada, a única pela qual poderia descer, enquanto um terceiro, a cavalo e de mosquetão em punho, se conservava de sentinela diante da grande porta da rua, a única pela qual poderia sair.

O terceiro gendarme era deveras significativo, e isto porque atrás dele se estendia um semicírculo de curiosos que bloqueavam hermeticamente a porta da estalagem.

«Procuram-me!», foi o primeiro pensamento de Andrea. «Diabo!»

A palidez invadiu a fronte do rapaz; olhou à sua volta com ansiedade.

O seu quarto, como todos os daquele andar, só tinha saída para a galeria exterior, aberta a todos os olhares.

«Estou perdido!», foi o seu segundo pensamento.

Com efeito, para um homem na situação de Andrea a prisão significava: julgamento, sentença e morte, a morte sem misericórdia e sem demora.

Por instantes comprimiu convulsivamente a cabeça entre as mãos.

Durante esses instantes, quase enlouqueceu de medo.

Mas daquele mundo de pensamentos que se lhe entrechocavam na cabeça não tardou a brotar um pensamento de esperança. Nos lábios descorados desenhou-se-lhe um sorriso pálido, que lhe iluminou as faces contraídas.

Olhou à sua volta. Os objectos que procurava encontravam-se reunidos em cima do mármore de uma secretária: eram uma pena, tinta e papel.

Molhou a pena na tinta e escreveu com mão que se esforçou por tornar firme as seguintes linhas, na primeira folha do caderno:

«Não tenho dinheiro para pagar, mas não sou um homem desonesto. Deixo em penhor este alfinete, que vale dez vezes a despesa que fiz. Espero me desculpem ter fugido ao amanhecer, tive vergonha! »

Tirou o alfinete da gravata e pô-lo em cima do papel.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069