O Conde de Monte Cristo - Cap. 99: A lei Pág. 931 / 1080

Pensando bem, o comportamento de Villefort apresentava-se ainda à baronesa sob um aspecto mutuamente vantajoso.

Mas a inflexibilidade do procurador régio deveria ficar por aí.

No dia seguinte procurá-lo-ia e conseguiria, senão que faltasse aos seus deveres de magistrado, pelo menos que lhe concedesse toda a latitude da indulgência.

A baronesa invocaria o passado, rejuvenesceria as suas recordações e suplicaria em nome de um tempo culpado, mas feliz. O Sr. de Villefort abafaria o caso ou pelo menos deixaria (e para o conseguir só tinha de desviar os olhos para outro lado), ou pelo menos deixaria fugir Cavalcanti e só procederia judicialmente contra esse simulacro de crime chamado contumácia.

Só então adormeceu mais tranquila.

No dia seguinte, às nove horas, levantou-se e, sem tocar a chamar a criada de quarto, sem dar sinal de existência a quem quer que fosse, arranjou-se e, vestida com a mesma simplicidade da véspera, desceu a escada, saiu do palácio, foi a pé até à Rua da Provença, meteu-se num fiacre e fez-se conduzir a casa do Sr. de Villefort.

Havia um mês que aquela casa maldita apresentava o aspecto lúgubre de um lazareto onde a peste se tivesse declarado.

Parte dos aposentos estavam fechados interior e exteriormente. As persianas corridas só se abriam um instante para renovar o ar. Nessas ocasiões, via-se então aparecer à janela a cara assustada de um lacaio. Depois a janela fechava-se como a laje de um túmulo cai sobre um sepulcro e os vizinhos cochichavam: «Iremos ver hoje sair novamente um caixão da casa do Sr. Procurador Régio?»

A Sr.ª Danglars sentiu um arrepio perante o aspecto daquela casa desolada. Apeou-se do fiacre e, com os joelhos pouco firmes, aproximou-se da porta fechada e tocou.

Só ao terceiro toque de campainha, cujo som lúgubre parecia participar da tristeza geral, apareceu um porteiro que entreabriu a porta apenas o indispensável para deixar passar as suas palavras.

Viu uma mulher, uma mulher da alta, uma mulher elegantemente vestida, e no entanto a porta continuou a permanecer quase fechada.

- Abra! - ordenou a baronesa.

- Antes de mais nada, quem é a senhora? - perguntou o porteiro.

- Quem sou?... Mas você conhece-me muito bem?

- Já não conhecemos ninguém, minha senhora.

- Mas você enlouqueceu, meu amigo! - exclamou a baronesa.

- Da parte de quem vem?

- Oh, isto é de mais!

- Minha senhora, são ordens, desculpe. O seu nome?

- Sr.ª Baronesa Danglars. Você já me viu mais de vinte vezes.

- É possível, minha senhora. Agora, que deseja?





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069