»Conde, havia para mim, com Valentine, uma felicidade infinita, imensa, desconhecida, uma felicidade demasiado grande, demasiado completa, demasiado divina para este mundo; uma vez que este mundo não ma deu, conde, devo dizer-lhe que sem Valentine não existe para mim na Terra mais do que desespero e desolação.
- Disse-te que tivesses esperança, Morrel - insistiu o conde.
- Acautele-se então, insisto também - redarguiu Morrel. - Porque o senhor tenta persuadir-me, e se me persuadir far-me-á perder a razão, porque me fará crer que posso tornar a ver Valentine.
O conde sorriu.
- Meu amigo, meu pai! - gritou Morrel, exaltado. Acautele- se, repito-lhe pela terceira vez, porque o ascendente que tem sobre mim assusta-me; tome cautela com o sentido das suas palavras, pois, como vê, os meus olhos reanimam-se e o meu coração reacende-se e renasce; acautele-se, porque me faria acreditar em coisas sobrenaturais... Obedeceria se me mandasse levantar a lousa do sepulcro da filha de Jairo; caminharia sobre as águas como o apóstolo se o senhor me fizesse sinal com a mão para caminhar sobre as águas... Acautele-se, porque obedecerei
- Tenha esperança, meu amigo - repetiu o conde.
- Ah! - exclamou Morrel, voltando a cair de toda a altura da sua exaltação no abismo da sua tristeza. - Ah, o senhor brinca comigo! Procede como essas boas mães, ou antes como essas mães egoístas que acalmam com palavras melífluas a dor dos filhos porque os seus gritos as incomodam. Não, meu amigo, não tinha razão em dizer-lhe que se acautelasse; não, não tema nada: sepultarei a minha dor com tanto cuidado no mais íntimo do meu peito, torná-la-ei tão profunda, tão secreta, que o senhor nem sequer terá de se incomodar a lamentá-la. Adeus, meu amigo, adeus! - Pelo contrário - redarguiu o conde -, a partir deste momento, Maximilien, viverás junto de mim e comigo, não me deixarás mais, e dentro de oito dias a França ficará para trás de nós.
- E continua a dizer-me que tenha esperança?
- Digo-te que tenhas esperança porque conheço um meio de te curar.
- Conde, o senhor entristece-me ainda mais, se é possível. O senhor não vê mais do que uma dor vulgar no desgosto que me feriu e julga confortar-me com um meio também vulgar, a viagem.
E Morrel abanou a cabeça com desdenhosa incredulidade.
- Que queres que te diga? - perguntou Monte-Cristo. - Tenho fé nas minhas promessas, deixa-me experimentar.
- Conde, o senhor prolonga apenas a minha agonia, mais nada.
- Quer dizer, és tão fraco coração que não tens coragem de dar ao teu amigo alguns dias para a experiência que ele tenta!