Era, como se vê, um homem cheio de humanidade este inspector, e bem digno das funções filantrópicas que desempenhava.
- Tem razão, senhor - concordou o governador - e a sua reflexão prova que estudou profundamente a matéria. Também temos numa masmorra separada desta apenas um vintena de pés e para a qual se desce por outra escada um velho abade, antigo chefe de partido em Itália, está aqui desde 1811, endoideceu por volta de fins de 1813 e que desde esse momento não é fisicamente reconhecível. Dantes chorava, agora ri, emagrecia, engordou. Quer vê-lo em vez deste? A sua loucura é divertida e não o entristecerá nada.
- Verei um e outro - respondeu o inspector. - É necessário fazer as coisas conscienciosamente.
O inspector andava na sua primeira inspecção e queria dar boa ideia de si às autoridades.
- Vejamos portanto este em primeiro lugar - acrescentou.
- Como queira - respondeu o governador.
E fez sinal ao chaveiro, que abriu a porta.
Ao ouvir rangerem as fechaduras maciças e chiarem os gonzos ferrugentos ao girarem nos seus eixos, Dantès, que se encontrava agachado a um canto da masmorra onde recebia com indizível prazer o delgado raio de luz que se filtrava através de um estreito respiradouro gradeado, levantou a cabeça. Ao ver um homem desconhecido, iluminado por dois chaveiros que empunhavam archotes e ao qual o governador falava de chapéu na mão, acompanhado por dois soldados, Dantès adivinhou de quem se tratava e, vendo finalmente apresentar-se uma ocasião de implorar a uma autoridade superiora, saltou para a frente com as mãos juntas.
Os soldados cruzaram imediatamente as baionetas, pois julgaram que o prisioneiro avançava para o inspector com más intenções. O próprio inspector deu um passo atrás.
Dantès viu que o tinham apresentado como um homem temível. Então, reuniu no olhar tudo o que o coração do homem pode conter de mansidão e humildade e, exprimindo-se numa espécie de eloquência religiosa, que surpreendeu os assistentes, procurou comover a alma do visitante.
O inspector escutou o discurso de Dantès até ao fim. Depois, virando-se para o governador, disse a meia voz:
- Voltará à devoção; está já disposto a sentimentos mais suaves.
Como vê, o medo produz o seu efeito nele. Recuou diante das baionetas; ora, um louco não recua diante de nada. A tal respeito fiz observações muito curiosas em Charenton
Depois, virando-se para o prisioneiro:
- Em resumo, que pede?
- Peço me digam que crime cometi; peço que me dêem juízes; peço que o meu processo seja instruído; peço finalmente que me fuzilem se sou culpado ou que me ponham em liberdade se estou inocente.
- É bem alimentado? - perguntou o inspector.