Quase imediatamente, e sem guardar o intervalo habitual, chegou uma carruagem de praça e a dama velada subiu rapidamente a escada.
A porta abriu-se e fechou-se.
Mas ainda antes de a porta se fechar, a dama exclamou:
- Lucien, meu amigo!...
De modo que o porteiro, que ouviu sem querer tal exclamação, soube então pela primeira vez que o seu locatário se chamava Lucien. Mas como era um porteiro modelo, prometeu a si mesmo nada dizer, nem sequer à mulher.
- Afinal, que aconteceu, querida amiga? - perguntou aquele de quem, na sua perturbação ou precipitação, a dama velada revelara o nome. - Vamos, diga!
- Meu amigo, posso contar consigo? - Certamente, sabe-o muito bem. Mas que aconteceu? O seu bilhete desta manhã deixou-me numa perplexidade terrível. Nunca vi tanta precipitação e desordem nos seus escritos. Vamos, tranquilize-me ou assuste-me por completo!
- Lucien, uma grande novidade! - disse a dama, pousando em Lucien um olhar interrogador. - O Sr. Danglars partiu esta noite.
- Partiu?... O Sr. Danglars partiu? Para onde?
- Ignoro.
- Ignora? ... Quer dizer que partiu para não mais voltar?
- Sem dúvida! Às dez horas da noite os seus cavalos conduziram-no à Barreira de Charenton. Aí, encontrou uma berlinda de posta completamente atrelada, meteu-se nela com o seu criado de quarto e disse ao seu cocheiro que ia a Fontainebleau.
- E a senhora, que diz a isso?
- Espere, meu amigo. Ele deixou-me uma carta...
- Uma carta?...
- Sim. Leia.
E a baronesa tirou da bolsa uma carta aberta, que apresentou a Debray.
Antes de a ler, Debray hesitou um instante, como se procurasse adivinhar o que ela continha, ou antes como, fosse o que fosse que ela contivesse, estivesse decidido a tomar antecipadamente um partido.
Passados alguns segundos, decerto já com as suas ideias bem definidas, leu.
Eis o que continha a carta que lançara tão grande perturbação no espírito da Sr.ª Danglars:
- «Minha senhora e fidelíssima esposa.»
Sem querer, Debray deteve-se e olhou a baronesa, que corou quase até à raiz dos cabelos.
- Leia - insistiu ela.
Debray continuou:
-«Quando receber esta carta já não terá marido! Oh, não perca a cabeça!... Já não terá marido, como já não terá filha, isto é, estarei numa das trinta ou quarenta estradas que levam fora de França. Devo-lhe explicações, e como a senhora é mulher para as compreender perfeitamente, dar-lhas-ei.
»Escute, pois:
»Esta manhã tive de fazer um pagamento de cinco milhões; fi-lo. Seguiu-se quase imediatamente outro da mesma importância; adiei-o para amanhã. hoje parto para evitar esse amanhã, que me seria muito desagradável suportar. Compreende o que quero dizer, não é verdade, minha senhora e preciosíssima, esposa?