Albert compreendeu o pensamento de Debray.
- Minha mãe - disse, virando-se para Mercédès -, é o Sr. Debray, secretário do ministro do Interior, um antigo amigo meu.
- Como antigo?... - balbuciou Debray. - Que quer dizer?
- Digo isto, Sr. Debray - respondeu Albert -, porque hoje já não tenho amigos nem devo voltar a tê-los. Agradeço-lhe muito ter-se dignado reconhecer-me, senhor.
Debray subiu dois degraus e veio dar um enérgico aperto de mão ao seu interlocutor.
- Creia, meu caro Albert - disse com a emoção de que era susceptível -, creia que senti profundamente a desventura que o atingiu e que estou ao seu dispor para tudo.
- Obrigado, senhor - respondeu Albert, sorrindo -, mas, apesar da nossa desventura, ficámos suficientemente ricos para não necessitarmos de recorrer a ninguém. Deixamos Paris e, depois de paga a nossa viagem, restam-nos cinco mil francos.
O rubor subiu à testa de Debray, que tinha um milhão na carteira; e por pouco poético que fosse o seu espírito exacto, não pôde deixar de reflectir que no mesmo prédio tinham estado pouco antes duas mulheres, das quais uma, justamente desonrada, se considerava pobre com um milhão e quinhentos mil francos debaixo das pregas da sua capa, e outra, injustamente atingida, mas sublime na sua desgraça, se considerava rica com alguns francos.
Este paralelo deitou por terra os seus propósitos de cortesia; a filosofia do exemplo esmagou-o. Balbuciou algumas palavras de mera delicadeza e desceu rapidamente.
Naquele dia, os amanuenses do ministério seus subordinados tiveram de lhe aturar resignadamente o mau humor.
Mas à tardinha tornava-se comprador de um belíssimo prédio situado no Bulevar da Madalena, que rendia cinquenta mil libras.
No dia seguinte, à hora em que Debray assinava a escritura, ou seja, por volta das cinco da tarde, a Sr.ª de Morcerf, depois de beijar ternamente o filho e de ser ternamente beijada por ele, subia para a diligência, cuja porta se fechava atrás de si.
No pátio da empresa de transportes Laffitte encontrava-se um homem escondido atrás de uma das janelas arqueadas das sobrelojas. Esse homem viu Mercédès subir para a carruagem; viu partir a diligência; viu Albert afastar-se.
Então passou a mão pela testa, cheio de dúvidas, e murmurou:
- Ai de mim, como hei-de restituir àqueles dois inocentes a felicidade que lhes roubei? Deus me ajudará.