XIV -AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO MICHU - que logo tratou de vender as suas terras a Beauvisage, rendeiro de Bellache - não pôde receber o seu dinheiro antes de uns vinte dias. Portanto, um mês depois da visita do marquês, Laurence, que informara os seus dois primos da existência da sua fortuna, propôs-lhes aproveitarem o dia da Serração da Velha para retirarem o milhão enterrado na floresta. A grande quantidade de neve que caíra impedira até então Michu de recolher esse tesouro; mas ele preferia fazer essa operação na companhia dos amos. Michu estava realmente disposto a sair daquela terra, pois tinha medo de si próprio.
- Malin acaba de chegar bruscamente a Gondreville, sem que se saiba porquê - disse ele à ama - e eu não resisto a pôr Gondreville em venda por causa da morte do proprietário. Considero-me culpado de não ter sabido obedecer às minhas inspirações.
- Por que razão terá ele saído de Paris em pleno Inverno?
- Toda Arcis fala nisso -respondeu Michu-; deixou a família em Paris, veio apenas acompanhado do criado de quarto. O Senhor Grévin, o notário de Arcis, a Senhora Marion, a mulher do recebedor geral de Aube e cunhado de Marion, que emprestou o nome a Malin, fazem-lhe companhia.
Laurence considerou a Serração da Velha como um excelente dia, pois era fácil desembaraçarem-se dos importunos, As mascaradas atraíam Os camponeses à cidade, e não estava ninguém no campo. Mas a escolha do dia foi precisamente servir a fatalidade, coisa frequente em não poucos casos criminais. O azar fez Os seus cálculos com a mesma habilidade que a Menina de Cinq-Cygne pusera nos seus. A aflição do Senhor e da Senhora de Hauteserre devia ser tamanha caso viessem a saber que estavam um milhão e dez mil francos em oiro num castelo situado na orla da floresta que os jovens de Hauteserre, consultados, opinaram que nada se lhes dissesse.