IX - DESDITAS DA POLÍCIA Ao saber que os seus filhos estavam ameaçados de morte, à Senhora de Hauteserre, que não acreditava finda a Revolução e conhecia muito bem a justiça sumária daqueles tempos, recuperou os sentidos e as forças; graças à própria violência da dor que lhos fizera perder. Atraída por uma horrível curiosidade, voltou a descer ao salão, cujo aspecto era agora o de um quadro verdadeiramente digno do pincel de um pintor de estilo. Sentado ainda diante da mesa de jogo, o cura brincava maquinalmente, com as fichas, enquanto, dissimuladamente, observava Peyrade e Corentin, que, de pé, junto ao fogão, falavam em voz baixa. Mais de uma vez o fino olhar de Corentin se encontrou com o olhar não menos fino do abade; mas, como dois adversários que se sentem fortes e que voltam à posição de defesa depois de cruzarem os ferros, uni e outro desviavam prontamente o olhar para outro lado.
O pobre do Senhor de Hauteserre, plantado em cima das suas duas pernas como uma garça-real, conservava-se ao lado do grosso, gordo, grande e avaro Goulard, na atitude em que o prostrara a estupefacção. Embora vestido como um burguês, o maire nunca deixava de ter o aspecto de um criado. Olhavam os dois com um olhar estúpido para os gendarmes, no meio dos quais Gothard continuava a lacrimejar, as mãos vigorosamente amarradas e tão apertadas que pareciam inchadas e roxas. Catarina, essa, mantinha-se numa atitude de simpleza e ingenuidade, sempre impenetrável. O brigadeiro que, segundo Corentin, fizera a tolice de prender os pobres pequenos; não sabia se devia retirar-se se continuar ali. Parecia pensativo no meio do salão, a mão apoiada no punho do sabre e os olhos postos nos dois parisienses. Os Durieu, estupefactos, e toda a demais gente do castelo, formavam um grupo admirável na sua inquietação.