O Conde de Monte Cristo - Cap. 29: Acasa Morrel Pág. 237 / 1080

Perante esta declaração quase brutal, Morrel empalideceu horrivelmente.

- Senhor - redarguiu -, até agora, e há mais de vinte e quatro anos que recebi esta casa das mãos do meu pai, que ele próprio geriu durante trinta e cinco anos, até agora nenhuma letra assinada por Morrel & Filhos foi apresentada à cobrança sem ser paga.

- Sim, sei isso - respondeu o inglês. - Mas fale francamente, de homem de honra para homem de honra: pagaria estas com a mesma pontualidade? Morrel estremeceu e olhou aquele que lhe falava, assim, com mais convicção do que ele.

- As perguntas feitas com essa franqueza deve-se dar uma resposta franca. Sim, senhor, pagarei se, como espero, o meu navio chegar a bom porto, pois a sua chegada proporcionar-me-á o crédito que os sucessivos acidentes de que tenho sido vítima me privaram. Mas se por desgraça o Pharaon, o último recurso com que conto, não chegar...

As lágrimas subiram aos olhos do pobre armador.

- Se esse último recurso lhe faltasse?... - insistiu o seu interlocutor.

- Bom - continuou Morrel -, é cruel dizê-lo, senhor... mas como já estou habituado à desgraça, é mister que me habitue também à vergonha. Nesse caso, creio que seria obrigado a suspender os meus pagamentos.

- Não tem amigos que o possam ajudar nessa circunstância? Morrel sorriu tristemente.

- Nos negócios não há amigos, senhor, bem sabe, há apenas correspondentes.

- É verdade - murmurou o inglês. - Portanto, é essa a sua única esperança?

- A única.

- A derradeira?

- A derradeira.

- De forma que se essa esperança falhar...

- Estarei perdido, senhor, completamente perdido.

- Quando vinha para aqui estava um navio a entrar no porto.

- Bem sei, senhor. Um rapaz que permaneceu fiel à minha pouca sorte passa parte do seu tempo num mirante situado no cimo da casa, na esperança de me vir anunciar em primeira mão uma boa notícia. Soube por ele da entrada desse navio.

- E não é o seu?

- Não, é um navio bordelês, a Gironde. Também vem da índia, mas não é o meu.

- Talvez tenha avistado o pharaon e lhe traga alguma notícia.

- Confesso-lhe, senhor, que receio quase tanto ter notícias do meu três mastros como permanecer na incerteza. A incerteza ainda é esperança.

Depois, o Sr. Morrel acrescentou com voz abalada:

- Este atraso não é natural

- O Pharaon partiu de Calcutá em 5 de Fevereiro; há mais de um mês que deveria cá estar.

- Que é isto? - perguntou o inglês, apurando o ouvido. - Que significa este barulho?

- Oh, meu Deus, meu Deus! - exclamou Morrel, empalidecendo. - Que mais haverá ainda?

De facto, ouvia-se um grande barulho na escada: idas e vindas e até se ouviu um grito de dor.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069