O Conde de Monte Cristo - Cap. 8: O Castelo de If Pág. 63 / 1080

E antes de Dantès pensar em abrir a boca para lhe responder, antes de ver onde o carcereiro pousava o pão, antes de se dar conta do sítio onde estava a bilha e antes de volver os olhos para o canto onde se encontrava a palha destinada a servir-lhe de cama, o carcereiro pegou no lampião, saiu, fechou a porta e privou o prisioneiro da luz baça que lhe mostrara como que ao clarão de um relâmpago as paredes encharcadas da sua prisão.

Encontrou-se então sozinho no meio das trevas e do silêncio, tão mudo e tão sombrio como as abóbadas cujo frio glacial sentia descer sobre a testa escaldante.

Quando os primeiros raios da alvorada trouxeram um pouco de claridade àquele antro, o carcereiro voltou com a ordem de deixar o prisioneiro onde se encontrava. Dantès nem sequer mudara de sítio. Uma mão de ferro parecia tê-lo pregado no mesmo local onde na véspera se detivera. Apenas o seu olhar profundo se ocultava debaixo de um inchaço causado pelo vapor húmido das suas lágrimas. Estava imóvel e olhava para o chão.

Passara assim toda a noite de pé e sem dormir um só instante.

O carcereiro aproximou-se dele, andou à sua volta, mas Dantès não pareceu vê-lo.

Bateu-lhe no ombro, Dantès estremeceu e abanou a cabeça.

- Não dormiu? - perguntou-lhe o carcereiro.

- Não sei - respondeu Dantès.

O carcereiro olhou-o com espanto.

- Não tem fome? - continuou.

- Não sei - respondeu novamente Dantès.

- Quer alguma coisa?

- Queria ver o governador.

O carcereiro encolheu os ombros e saiu.

Dantès seguiu-o com a vista, estendeu as mãos para a porta entreaberta, mas a porta fechou-se.

Então o peito pareceu rasgar-se-lhe num longo soluço. As lágrimas que lhe enchiam o peito brotaram como dois riachos.

Ajoelhou-se, encostou a testa ao chão e rezou durante muito tempo. Repassou no espírito toda a sua vida passada e perguntou a si mesmo que crime cometera na vida, tão jovem ainda, que merecesse tão cruel punição.

O dia passou-se assim. Comeu apenas alguns nacos de pão e bebeu alguns golos de água. Tão depressa ficava sentado e absorto nos seus pensamentos como caminhava a toda a volta da prisão, qual fera encerrada numa jaula de ferro.

Havia sobretudo um pensamento que o punha fora de si: o de que durante a travessia, onde, na ignorância do local para onde o conduziam, permanecera tão calmo e tranquilo, poderia ter-se dez vezes deitado ao mar e, uma vez na água, graças à sua perícia de nadador, graças ao hábito que o tornara um dos mais hábeis mergulhadores de Marselha, desaparecer debaixo de água, fugir aos guardas, alcançar a costa, escapar-se, esconder-se em qualquer enseada deserta, esperar um navio genovês ou catalão, alcançara Itália ou a Espanha, e de lá escrever a Mercédès para que se lhe juntasse.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069