O Conde de Monte Cristo - Cap. 11: O papão da Córsega Pág. 80 / 1080

O olhar do ministro da Polícia virou-se com expressão de profundo desprezo para Villefort, que inclinou a cabeça com a modéstia do triunfo.

- Não digo isto em sua intenção, Blacas - continuou Luís XVIII -, porque se você nada descobriu, ao menos teve a feliz ideia de perseverar a sua desconfiança. Outro que fosse talvez tivesse considerado a revelação do Sr. de Villefort insignificante ou então sugerida por uma ambição venal.

Estas palavras aludiam às que o ministro da Polícia pronunciara com tanta confiança uma hora antes.

Villefort compreendeu o jogo do rei. Outro talvez se tivesse deixado empolgar pela embriaguez do elogio; mas ele temia fazer do ministro da Polícia um inimigo mortal, embora sentisse que este estava irremediavelmente perdido. Com efeito, o ministro que na plenitude do seu poder não soubera adivinhar o segredo de Napoleão, poderia nas convulsões da sua agonia, descobrir o de Villefort. Para isso, bastar-lhe-ia interrogar Dantès. Veio, pois, em socorro do ministro em vez de o enterrar.

- Sire - disse Villefort -, a rapidez dos acontecimentos deve provar a Vossa Majestade que só Deus os poderia impedir levantando uma tempestade. O que Vossa Majestade julga da minha parte o efeito de uma profunda perspicácia deve-se pura e simplesmente ao acaso. Aproveitei esse acaso como servidor dedicado e mais nada. Não me conceda mais do que mereço, Sire, para nunca voltar atrás na primeira ideia que tiver concebido a meu respeito.

O ministro da Polícia agradeceu ao jovem com um olhar eloquente e Villefort compreendeu que fora bem sucedido no seu projecto, isto é, que sem perder nada do reconhecimento do rei acabava de fazer um amigo com que, se fosse caso disso, poderia contar.

- Está bem - disse o rei. - E agora, meus senhores - prosseguiu virando-se para o Sr. de Blacas e para o ministro da Polícia -, já não me são necessários, podem-se retirar. O que resta fazer é da competência do ministro da Guerra.

- Ainda bem, Sire - disse o Sr. de Blacas -, que podemos contar com o Exército. Vossa Majestade sabe como todos os relatórios o dão como dedicado ao seu governo.

- Não me venha com relatórios! Agora, duque, - sei a confiança que se pode ter neles. Eh! Mas a propósito de relatórios, Sr. Barão, que soube de novo acerca do caso da Rua Saint-Jacques? - Acerca do caso da Rua Saint-Jacques! - deixou escapar Villefort, sem conter uma exclamação.

Mas deteve-se de súbito e disse:

- Perdão, Sire, a minha dedicação a Vossa Majestade faz-me constantemente esquecer, não o respeito que lhe devo e que está muito profundamente gravado no meu coração, mas sim as regras da etiqueta.

- Não se preocupe com isso, senhor - redarguiu Luís XVIII. - Hoje adquiriu o direito de interrogar.

- Sire - respondeu o ministro da Polícia -, vinha precisamente dar hoje a Vossa Majestade as novas informações que recolhi a esse respeito quando a atenção de Vossa Majestade foi desviada para a terrível catástrofe do golfo. Agora essas informações já não têm nenhum interesse para o rei

- Pelo contrário, senhor, pelo contrário - replicou Luís XVIII

- Esse caso parece-me ter relação direta com aquele de que nos ocupamos e a morte do general Quesnel talvez nos ponha na pista de uma grande conspiração interna.

Ao ouvir o nome do general Quesnel, Villefort estremeceu.

- Com efeito, Sire - prosseguiu o ministro da Polícia -, tudo leva a crer que essa morte é o resultado não de um suicídio, como a princípio pareceu, mas sim de um assassínio. Ao que parece, o general Quesnel saía de um clube bonapartista quando desapareceu.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069