O Conde de Monte Cristo - Cap. 43: A Casa de Auteuil Pág. 422 / 1080

Sabia que o senhor era corso, via-o constantemente carrancudo e a ruminar qualquer velha história de vendetta, e desculpava-lhe isso em Itália, porque em Itália essas coisas são compreensíveis, mas em França o assassínio é geralmente considerado de muito mau gosto. Há gendarmes que se ocupam dele, juízes que o condenam e cadafalsos que o vingam.

Bertuccio juntou as mãos, e como, ao executar as suas diversas evoluções, não largava a lanterna, a luz iluminou-lhe o rosto transtornado.

Monte-Cristo examinou-o com o mesmo olhar com que em Roma assistira ao suplício de Andrea. Depois, num tom de voz que fez correr um novo arrepio pelo corpo do pobre intendente, disse:

- O abade Busoni mentiu-me, portanto, quando, depois da sua viagem a França em 1829, o mandou ter comigo com uma carta de recomendação em que me louvava as suas preciosas qualidades. Pois bem, vou escrever ao abade. Torná-lo-ei responsável pelo seu protegido e saberei sem dúvida que caso de assassínio é esse. Mas desde já o previno, Sr. Bertuccio, que quando visito um país tenho o hábito de respeitar as suas leis e que não tenho vontade de, por sua causa, arranjar problemas com a justiça francesa.

- Não faça isso, Excelência! Tenho-o servido fielmente, não é verdade? - protestou Bertuccio, desesperado. - Tenho sido sempre um homem honesto e até praticado o máximo de boas acções ao meu alcance.

- Não digo que não - redarguiu o conde -, mas por que diabo está agitado dessa maneira? É mau sinal: - uma consciência pura não traz tanta palidez às faces nem tanta febre às mãos de um homem...

- Mas, Sr. Conde - contrapôs Bertuccio, hesitante -, não foi o senhor mesmo quem me disse que o Sr. Abade Busoni, que ouviu a minha confissão nas prisões de Nímes, o prevenira, ao mandar-me ter consigo, de que eu tinha um grande peso na consciência?

- Pois preveniu, mas como mo recomendava dizendo-me que seria um excelente intendente, julguei que tivesse roubado, apenas.

- Oh, Sr. Conde! - exclamou Bertuccio, com desdém.

- Ou que, como era corso, não tivesse podido resistir ao desejo de «fazer uma pele», como dizem na Córsega por antífrase, quando, pelo contrário, «desfazem» uma.

- Pois bem, sim, meu senhor, sim, meu bom senhor, é isso! - gritou Bertuccio, ajoelhando diante do conde. - Sim, foi uma vingança, juro-lhe, uma simples vingança.

- Compreendo, mas o que não compreendo é que seja precisamente esta casa a galvanizá-lo a esse ponto.

- Mas, senhor, não é isso tudo quanto há de mais natural, se foi nesta casa que a vingança se consumou?

- O quê, na minha casa?!





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069