O Conde de Monte Cristo - Cap. 56: Andrea Cavalcanti Pág. 550 / 1080

- Senhor - balbuciou o rapaz, desorientado -, espero que nenhum falso relatório...

- Que diz? Ouvi falar do senhor pela primeira vez ao meu amigo Wilmore, o filantropo. Soube que o encontrara numa posição desagradável, mas ignoro qual e não lhe fiz nenhuma pergunta. Não sou curioso. As suas desgraças interessaram-no e engraçou consigo. Disse-me que lhe queria restituir a posição social que perdera, que procuraria o seu pai e que havia de o encontrar. E de facto procurou-o e encontrou-o, ao que parece, uma vez que ele está aqui. Finalmente, preveniu-me ontem da sua chegada e deu-me ainda outras instruções relativas à sua fortuna. E mais nada. Sei que o meu amigo Wilmore é um original, mas como é ao mesmo tempo um homem que sabe o que faz, rico como uma mina de ouro, e que por consequência se pode entregar às suas originalidades sem que elas o arruínem, prometi seguir as suas instruções. Agora, senhor, não se ofenda com a minha pergunta: como serei obrigado a auxiliá-lo um pouco, gostaria de saber se as desgraças por que passou, desgraças independentes da sua vontade e que não diminuem de modo algum a consideração que me merece, o não tornaram um tanto estranho a essa sociedade em que a sua fortuna e o seu nome o chamam a fazer tão boa figura...

- Senhor - respondeu o rapaz, recuperando o sangue-frio à medida que o conde falava -, tranquilize-se quanto a isso. Os raptores que me afastaram do meu pai e que sem dúvida tinham como objectivo vender-me mais tarde a ele, como fizeram, calcularam que para tirar bom partido de mim era necessário deixar-me todo o meu valor pessoal, e até aumentá-lo, se fosse possível. Recebi portanto uma educação bastante boa e fui tratado pelos ladrões de crianças mais ou menos como o eram na Ásia Menor os escravos, de que os seus senhores faziam gramáticos, médicos e filósofos para os venderem mais caros no mercado de Roma.

Monte-Cristo sorriu com satisfação; ao que parece, não esperava tanto do Sr. Andrea Cavalcanti.

- Aliás - prosseguiu o jovem -, se houvesse em mim qualquer falha de educação, ou antes, de hábito da sociedade, teriam, suponho, a indulgência de me desculpar em consideração para com as infelicidades que acompanharam o meu nascimento e perseguiram a minha juventude.

- Bom - disse Monte-Cristo negligentemente -, fará como quiser, visconde, pois é senhor de si e isso diz-lhe respeito; mas se estivesse no seu lugar, dou-lhe a minha palavra de honra que, pelo contrário, não diria uma palavra acerca de todas essas aventuras. A sua história é um romance, e a sociedade, que adora os romances metidos entre duas capas de papel amarelo, desconfia estranhamente daqueles que vê encadernados em pergaminho vivo, mesmo dourado, como o senhor o pode ser.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069