O Conde de Monte Cristo - Cap. 62: Os fantasmas Pág. 600 / 1080

Tudo isto foi cimentado por uma permanência de duzentos anos naquelas profundezas inauditas, porque uma revolução derrubou o imperador que ordenara a experiência e só deixou a acta de que constava o cozimento dos vasos e a sua descida ao fundo do mar. Passados duzentos anos encontrou-se a acta e pensou-se recuperar os vasos. Mergulhadores munidos de máquinas construídas propositadamente partiram à descoberta na baía em que tinham sido lançados; mas dos dez só se encontraram três: os outros tinham sido dispersos e quebrados pelas vagas. Quero muito a estes vasos no fundo dos quais imagino às vezes que monstros informes, assustadores, misteriosos e idênticos àqueles que só os mergulhadores vêem, fixaram com espanto o seu olhar mortiço e frio, e nos quais dormiram cardumes de peixes, que neles se refugiaram para fugir à perseguição dos seus inimigos.

Entretanto, Danglars, pouco apreciador de curiosidades, arrancava maquinalmente, uma a uma, as flores de uma magnífica laranjeira. E quando acabou com a laranjeira dirigiu-se para o cacto, mas este, de temperamento menos fácil do que a laranjeira, picou-o afrontosamente.

Então, estremeceu e esfregou os olhos como se saísse de um sonho.

- Senhor -disse-lhe Monte-Cristo sorrindo -, sei que é apreciador de quadros e que tem alguns magníficos; por isso, não lhe recomendo os meus, embora tenha aqui dois Hobbemas, um Paul Potter, um Mieris, dois gerards Dow, um Rafael, um Van Dyck, um Zurbaran e dois ou três Murillos dignos de lhe serem apresentados.

- Aqui está um Hobbema - disse Debray. - Reconheço-o.

- Sim, é verdade!

- Ofereceram-no ao museu.

- Que não tem nenhum, creio? - arriscou Monte-Cristo.

- Não, e mesmo assim não o quis comprar.

- Porquê? - perguntou Château-Renaud.

- Você tem graça! Porque o Governo não é suficientemente rico para isso.

- Perdão! - desculpou-se Château-Renaud. - Apesar de ouvir dizer isso todos os dias, de há oito anos a esta parte, ainda não me consegui habituar.

- Acabará por se habituar - disse Debray.

- Não me parece - respondeu Château-Renaud.

- O Sr. Major Bartolomeo Cavalcanti! O Sr. Visconde Andrea Cavalcanti! - anunciou Baptistin.

De gravata de cetim preto acabada de sair das mãos do fabricante, barba acabada de fazer, bigode grisalho, olhar atrevido e uniforme de major adornado com três placas e cinco cruzes, em suma, numa indumentária impecável de velho soldado, assim apareceu o major Bartolomeo Cavalcanti, o terno pai que conhecemos.

Junto dele, de casaca novinha em folha, caminhava de sorriso nos lábios o visconde Andrea Cavalcanti, o filho respeitoso que também já conhecemos.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069