O Conde de Monte Cristo - Cap. 65: Cena conjugal Pág. 623 / 1080

Depois de Lucien sair, Danglars instalou-se no seu lugar no canapé, fechou o livro que ficara aberto e, tomando uma atitude horrivelmente pretensiosa, continuou a brincar com o cão. Mas como o cão, que não tinha por ele a mesma simpatia que por Debray, o quisesse morder, agarrou-o pelo cachaço e atirou-o para cima doutro canapé colocado do lado oposto do quarto.

O animal ganiu ao atravessar o espaço; mas chegado ao seu destino aninhou-se atrás de uma almofada e, estupefacto com semelhante tratamento a que não estava habituado, ficou mudo e quedo.

- Sabe, senhor - disse a baronesa sem pestanejar - que está a fazer progressos? Habitualmente é apenas grosseiro; esta noite é brutal.

- É que estou esta noite de mais mau humor do que habitualmente - respondeu Danglars.

Hermine olhou o banqueiro com supremo desdém. Regra geral, tais olhares exasperavam o orgulho de Danglars; mas naquela noite pareceu quase não reparar neles.

- E que me interessa a mim o seu mau humor? - replicou a baronesa, irritada com a impassibilidade do marido. - Porventura essas coisas dizem-me respeito? Guarde os seus maus humores para si ou descarregue-os nos seus escritórios. Uma vez que tem empregados a quem paga, eles que lhe aturem os maus humores!

- De modo nenhum - respondeu Danglars. - Os seus conselhos são insensatos, minha senhora, e por isso não os seguirei. Os meus escritórios são o meu Pactolo, como diz, se me não engano, o Sr. Desmoustiers, e não desejo mudar-lhe o curso nem perturbar-lhe a calma. Os meus empregados são pessoas honestas, que me ganham a minha fortuna e a quem pago uma taxa infinitamente inferior à que merecem, se os avaliar de acordo com o que me rendem. Portanto, não descarregarei a minha cólera sobre eles; descarregá-la-ei sobre aqueles que papam os meus jantares, rebentam os meus cavalos e esvaziam o meu cofre.

- E quem são essas pessoas que esvaziam o seu cofre? Explique-se mais claramente, senhor, peço-lhe.

- Oh, esteja tranquila! Embora fale por enigmas, estou certo de que não precisará de muito tempo para os decifrar redarguiu Danglars. - As pessoas que esvaziam o meu cofre são aquelas que numa hora tiram dele a bagatela de quinhentos mil francos.

- Não o compreendo, senhor - disse a baronesa, procurando dissimular simultaneamente a emoção da voz e o rubor do rosto.

- Pelo contrário, compreende muito bem - contrapôs Danglars. Mas se a sua má vontade continuar, dir-lhe-ei que acabo de perder setecentos mil francos do empréstimo espanhol.

- Essa agora! - exclamou a baronesa, troçando. - E é a mim que torna responsável por essa perda?

- Porque não?

- Tenho por acaso a culpa se o senhor perdeu setecentos mil francos?

- Seja como for, eu é que a não tenho.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069