O Conde de Monte Cristo - Cap. 76: Os progressos de Cavalcanti filho Pág. 725 / 1080

Danglars dirigiu-se imediatamente para a porta de comunicação e abriu-a.

Viram-se então as duas raparigas sentadas no mesmo banco e diante do mesmo piano. Acompanhavam-se cada uma com uma das mãos, exercício a que se tinham habituado por brincadeira e se haviam tornado de uma perícia notável. Mademoiselle de Armilly, que formava com Eugénie, graças à moldura da porta, um desses quadros vivos muito em uso na Alemanha, era de uma beleza deveras notável, ou antes, de uma gentileza requintada. Era uma mulherzinha franzina e loura como uma fada, de comprido cabelo encaracolado que lhe caía sobre o pescoço um bocadinho alto, como Perugino retratava às vezes as suas virgens, e olhos velados pela fadiga. Dizia-se que tinha o peito fraco e que, como a Antónia do Violino de Cremona, morreria um dia a cantar.

Monte-Cristo deitou àquele gineceu um olhar rápido e curioso.

Era a primeira vez que via Mademoiselle de Armilly, de quem tantas vezes ouvira falar naquela casa.

- Então estamos excluídos da função? - perguntou o banqueiro à filha.

Em seguida levou o rapaz para a salinha e, quer por acaso, quer de propósito, a porta foi empurrada atrás de Andrea de maneira que do sítio onde se encontravam sentados Monte-Cristo e a baronesa não pudessem ver nada. Mas como o banqueiro acompanhara Andrea, a Sr.ª Danglars nem sequer pareceu notar semelhante pormenor.

Pouco depois o conde ouviu a voz de Andrea soar aos acordes do piano acompanhando uma canção corsa.

Enquanto o conde escutava sorrindo a canção, que lhe fazia esquecer Andrea e recordar Benedetto, a Sr.ª Danglars gabava a Monte-Cristo a força de alma do marido, que ainda naquela manhã perdera numa falência milanesa, trezentos ou quatrocentos mil francos.

E, com efeito, o elogio era merecido. Porque se o conde não tivesse sabido do caso pela baronesa ou talvez por um dos meios que tinha de saber tudo, a cara do barão nada lhe teria revelado a tal respeito.

«Bom, começa a esconder o que perde. Há um mês, gabava-se ... », pensou Monte-Cristo. Depois, em voz alta:

- Mas, minha senhora, o Sr. Danglars conhece tão bem a Bolsa que recuperará sempre lá o que perder noutro lado.

- Vejo que labora no erro comum - redarguiu a Sr.ª Danglars.

- E qual é esse erro? - perguntou Monte-Cristo.

- O de que o Sr. Danglars joga, quando, pelo contrário, nunca joga.

- Tem razão, minha senhora. Recordo-me de o Sr. Debray me haver dito... A propósito, que é feito do Sr. Debray? Há três ou quatro dias que o não vejo.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069