O Conde de Monte Cristo - Cap. 80: A acusação Pág. 774 / 1080

- Acautele-se - disse o Sr. de Avrigny. - Ela será lenta essa morte; vê-la-á aproximar-se, depois de ferir o seu pai, a sua mulher, talvez o seu filho.

Sufocado, Villefort apertou o braço do médico.

- Ouça-me! - gritou. - Tenha compaixão de mim, ajude-me!... Não, a minha filha não é culpada... Se me levarem perante um tribunal, continuarei a dizer - «Não, a minha filha não é culpada... não existe crime em minha casa...» Não quero, ouviu? Não quero que haja crime em minha casa. Porque quando o crime entra em qualquer parte, é como a morte, não entra sozinho. Ouça, que lhe interessa que eu morra assassinado?...

»É meu amigo? ... É um homem? Tem um coração?... Não, é um médico! ... Pois bem, digo-lhe que a minha filha não será arrastada por mim para as mãos do carrasco!... Ah, uma ideia que me devora, que me leva, como um insensato, a arranhar o peito com as unhas!... E se estivesse enganado, doutor? Se fosse outra pessoa e não a minha filha? Se um dia eu lhe aparecesse, pálido como um fantasma, e lhe dissesse: «Assassino! Mataste a minha filha!... » Olhe, se isso acontecesse, sou cristão, Sr. de Avrigny, mas mesmo assim matava-me.

- Está bem, esperarei - cedeu o médico, após um instante de silêncio.

Villefort olhou-o como se duvidasse ainda das suas palavras.

- Simplesmente - continuou o Sr. de Avrigny em voz lenta e solene -, se alguma pessoa da sua casa adoecer, se o senhor mesmo se sentir mal, não me chame porque não voltarei. Estou disposto a compartilhar consigo esse segredo terrível, mas não quero que a vergonha e o remorso entrem em minha casa, frutifiquem e cresçam na minha consciência, tal como o crime e a infelicidade vão crescer e frutificar na sua casa.

- Abandona-me, portanto, doutor?

- Abandono porque não o posso acompanhar mais longe e só me detenho ao pé do cadafalso. Surgirá qualquer outra revelação que porá termo a essa horrível tragédia. Adeus.

- Doutor, suplico-lhe!

- Todos os horrores que conspurcam o meu pensamento tornam-me a sua casa odiosa e fatal. Adeus, senhor.

- Uma palavra, só mais uma palavra, doutor! O senhor retira-se deixando-me todo o horror da situação, horror que aumentou com o que me revelou. Mas que se dirá da morte instantânea, súbita, daquele pobre velho servidor?

- É justo - disse o Sr. de Avrigny. - Acompanhe-me.

O médico saiu adiante e o Sr. de Villefort seguiu-o. Os criados, inquietos, estavam nos corredores e nas escadas por onde devia passar o médico.

- Senhor - disse Avrigny a Villefort, falando em voz alta, de forma que toda a gente o ouvisse -, o pobre Barrois há anos que levava uma vida demasiado sedentária.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069