O Conde de Monte Cristo - Cap. 95: O pai e a filha Pág. 897 / 1080

No entanto, desta vez, essa tranquilidade, essa passividade, como dizem os filósofos, tinha outra origem; provinha de, como filha submissa e dedicada... - um sorriso breve desenhou-se nos lábios carminados da jovem - tentar a obediência.

- E então? - perguntou Danglars.

- E então, senhor - prosseguiu Eugénie -, tentei até ao limite das minhas forças, e agora que chegou o momento, apesar de todos os esforços que empreguei sobre mim própria, sinto-me incapaz de obedecer.

- Mas enfim, Eugénie, a razão? - perguntou Danglars, que, espírito primário, parecia antes de mais nada esmagado pelo peso daquela lógica implacável, cuja fleuma denotava tanta premeditação e força de vontade. - Qual a razão dessa recusa?

- A razão? - replicou a jovem. - Oh, meu Deus, não é que o homem seja mais feio, mais estúpido ou mais desagradável do que outro, não. O Sr. Andrea Cavalcanti pode até passar, junto daqueles que apreciam os homens pela cara e pela figura, por ser um modelo muitíssimo aceitável. Também não é porque o meu coração esteja menos inclinado para ele do que para qualquer outro; isso seria uma razão de colegial que considero absolutamente abaixo de mim. Não amo absolutamente ninguém, senhor; sabe-o, não é verdade? Não vejo, portanto, por que motivo, sem disso ter absoluta necessidade, iria embaraçar a minha vida com um companheiro eterno. Não disse o sábio algures: «Nada de excessos!»? E noutro passo: «Trazei tudo convosco»? Até aprendi estes dois aforismos em latim e em grego. Um é, creio, de Fedro, e o outro, de Bias. Pois bem, meu querido pai, no naufrágio da vida, porque a vida é um naufrágio eterno das nossas esperanças, lanço ao mar a minha bagagem inútil, muito simplesmente, e fico com a minha vontade, disposta a viver absolutamente só e portanto absolutamente livre.

- Desgraçada! Desgraçada! - murmurou Danglars, empalidecendo, pois conhecia por longa experiência a solidez do obstáculo com que deparava tão de repente.

-«Desgraçada! Desgraçada», diz o senhor? - prosseguiu Eugénie. - Mas não, na realidade, e a exclamação parece-me absolutamente teatral e afectada. Pelo contrário, feliz porque lhe pergunto: que me falta? A sociedade acha-me bela, e isso é qualquer coisa que merece ser acolhida favoravelmente. Gosto dos bons acolhimentos: alegram as caras e os que me rodeiam parecem-me também menos feios.

»Sou dotada de algum espírito e de certa sensibilidade relativa, que me permite extrair da existência geral para o fazer entrar na minha o que nela encontro de bom, como faz o macaco quando parte a noz verde para lhe extrair o que contém.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069