O Conde de Monte Cristo - Cap. 105: O Cemitério do Père-lachaise Pág. 978 / 1080

- Volto, porque recomeço a sofrer.

O conde franziu a testa; parecia entregue a uma sombria hesitação.

- Maximilien! Maximilien! As ideias em que te absorves são indignas de um cristão.

- Oh, tranquilize-se, meu amigo - respondeu Morrel erguendo a cabeça e mostrando ao conde um sorriso cheio de inefável tristeza -, já não serei eu que procurarei a morte.

- Portanto, nada de armas, nada de desespero - disse Monte-Cristo.

- Não, porque tenho melhor para tratar da minha dor do que o cano de uma pistola ou a ponta de uma navalha.

- Pobre louco!... Tem o quê?

- Tenho a minha dor. Ela própria me matará.

- Amigo - atalhou Monte-Cristo com uma melancolia igual à dele -, escuta-me. Um dia, num momento de desespero igual ao teu, porque implicava uma resolução idêntica, quis-me matar como tu; outro dia, teu pai, igualmente desesperado, quis-se matar também Se alguém dissesse ao teu pai, no momento em que dirigia o cano da pistola para a testa; se me dissessem a mim, no momento em que afastava da minha cama o pão do prisioneiro, em que não tocava havia três dias; se nos dissessem a ambos, enfim, nesse momento supremo: «Vive! Um dia virá em que serás feliz e abençoarás a vida»; fosse donde fosse que viesse essa voz, acolhê-la-íamos com o sorriso da dúvida ou com a angústia da incredulidade, e no entanto quantas vezes, ao beijar-te, o teu pai não terá abençoado a vida, quantas vezes até....

- Ah, mas o senhor só perdera a liberdade e o meu pai só perdera a fortuna! - exclamou Morrel, interrompendo o conde. - Eu perdi Valentine!

- Olha para mim, Morrel - pediu Monte-Cristo com a solenidade que em certas ocasiões o tornava tão grande e persuasivo. - Olha para mim: não tenho lágrimas nos olhos, nem febre nas veias, nem pulsações fúnebres no coração; contudo, vejo-te sofrer, Maximilien, a ti que amo como amaria um filho! Pois bem, isto não te diz, Morrel, que a dor é como a vida e que há sempre qualquer coisa desconhecida para lá dela? Ora se te peço, se te ordeno que vivas, Morrel, é na convicção de que um dia me agradecerás ter-te conservado a vida.

- Meu Deus! - exclamou o rapaz. - Meu Deus, que quer dizer com isso, conde? Cautela! Talvez o senhor nunca tenha amado...

- Criança! - respondeu o conde.

- De amor percebo eu - prosseguiu Morrel. - Como sabe, sou soldado desde que sou homem; cheguei aos vinte e nove anos sem amar, pois nenhum dos sentimentos que experimentei até então merecia o nome de amor. Aos vinte e nove anos conheci Valentine e durante cerca de dois anos amei-a, durante cerca de dois anos pude avaliar as virtudes da filha e da mulher inscritas pela própria mão do Senhor naquele coração aberto para mim como um livro.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069