Entrámos então numa vida serena, sem romance e sem luta. Os corações tinham calmado, e falavam baixo. O conde passeava no campo com mademoiselle Rize; lord Grenlei fumava, cheio de tédio, o seu cachimbo de ópio; eu jogava as armas com os oficiais ingleses; D. Nicazio negociava; Ritmel tinha um ar feliz e misterioso; a condessa recebia, guiava os seus póneis, e todas as noites, no teatro, fazia reluzir ao gaz o louro esplendor dos seus cabelos e a palidez preciosa das suas perolas. Santa paz!
O tempo estava adorável. Malta resplandecia, a baía reluzia ao sol, os jardins floresciam, os olhos das maltesas suspiravam. Era o tempo das flores da laranjeira. Só Carmen emagrecia e vivia retirada.
Mr. Perni entrava em convalescença: passava o tempo deitado num sofá, de dia compondo uma ópera cómica, à noite jogando com alguns oficiais, e salpicando a gravidade britânica de calembourgs bonapartistas.
Uma ocasião, ao sair de casa dele, onde tinha perdido algumas dúzias de libras, recolhia eu a Clarence-Hotel levemente irritado, e sentindo um prazer excêntrico em cantar o fado pelas ruas de Malta, a mil léguas do Bairro Alto. O pavilhão que nós habitávamos em Clarence-Hotel dava sobre um jardim todo escuro de árvores e de moitas de flores.
Ordinariamente o conde e eu entravamos pelo jardim. Tínhamos uma pequena chave que abria a portinha verde no muro, todo coberto de musgo e de copas arbustos orientais. Nessa noite, ao abrir a porta, cantando em voz alta, senti sumir-se rapidamente na espessura das folhagens um vulto.