- Doutor, doutor, por amor de Deus! esses indícios não provam. Este lenço, de mulher indubitavelmente, estou convencido que é o mesmo que o morto trazia no bolso. É verdade: não se lembra que não lhe encontrámos lenço?
- E não se lembra também que não lhe encontrámos gravata?
O mascarado calou-se sucumbido.
- No fim de contas eu não sou aqui juiz, nem parte, exclamei eu. Deploro vivamente esta morte, e falo nisto unicamente pelo pesar e pelo horror que ela me inspira. Que este jovem se matasse ou que fosse morto, que caísse às mãos de uma mulher ou às mãos de um homem, importa-me pouco. O que devo dizer-lhe é que o cadáver não pode ficar por muito mais tempo insepulto: é preciso que o enterrem hoje. Mais nada. É dia. O que desejo é sair.
- Tem razão, vai sair já, cortou o mascarado.
E em seguida, tomando M. C. pelo braço, disse-me:
- Um momento! Eu volto já!
E saíram ambos pela porta que comunicava com o interior da casa, fechando-a à chave pelo outro lado.
Fiquei só, passeando agitadamente.
A luz do dia tinha feito surgir no meu espírito uma multidão de pensamentos inteiramente novos e diversos daqueles que me tinham ocupado durante a noite. há pensamentos que não vivem senão no silêncio e na sombra, pensamentos que o dia desvanece e apaga; há outros que só surgem ao clarão do sol.
Eu sentia no cérebro uma multidão de ideias estremunhadas, que à luz repentina da madrugada voejavam em turbilhão como um bando de pombas amedrontadas pelo estridor de um tiro.
Maquinalmente entrei na alcova, sentei-me na cama, encostei um braço no travesseiro.
Então, não sei como, olhei, reparei, vi, com estranha comoção, sobre a alvura do travesseiro, preso num botão de madrepérola, um longo cabelo louro, um cabelo de mulher.