Um Caso Tenebroso - Cap. 6: VI - FISIONOMIAS REALISTAS NO TEMPO DO CONSULADO Pág. 59 / 249

A Menina Goujet era uma dessas criaturas cujo retrato, feito com duas palavras, é capaz de permitir ao espírito menos imaginativo representá-la com toda a facilidade: pertencia ao género das grande mastronças. Sabendo-se feia, era a primeira a rir-se da sua fealdade, mostrando os grandes dentes amarelos, a tez e as mãos ossudas.

Era, decididamente, boa e alegre. Usava ainda a velha casaquinha de outros tempos, saia muito rodada, com as algibeiras sempre repletas de chaves, uma touca de laços e um rolo de cabelos. Tivera quarenta anos muito cedo; mas vingava-se, e assim o dizia, mantendo-se nessa idade havia já vinte anos. Venerava a nobreza e sabia manter a sua própria dignidade conferindo às pessoas nobres tudo quanto lhes era devido em respeito e homenagens.

Viera mesmo a propósito a Cinq-Cygne esta companhia para a Senhora de Hauteserre, a: qual, como, seu marido, não tinha ocupações rurais nem, como Laurence, o tónico, de um ódio susceptível de a ajudar a suportar o peso de uma vida solitária. Eis porque tudo melhorara ali nos últimos seis anos. O culto católico, restabelecido, permitia cumprir os deveres religiosos, muito mais importantes na vida aldeã que em qualquer outra parte. O Senhor e a Senhora de Hauteserre, sossegados com os actos tranquilizadores do Primeiro Cônsul, haviam podido corresponder-se com os filhos, receber notícias deles, não estavam já em desassossego por sua causa, e, inclusivamente, podiam requerer a sua irradiação e que voltassem para França. O Tesouro liquidara as rendas em atraso, e pagava regularmente os semestres. Os Hauteserre dispunham agora de mais mil francos de renda, além da renda vitalícia. O velho orgulhava-se muito da prudência das suas previsões. Empregara todas as suas economias, vinte mil francos, ao mesmo tempo que as da sua pupila, antes do 18 de Brumário, acontecimento que permitiu, como se sabe, fazer subir os fundos de doze para dezoito francos.





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