O Conde de Monte Cristo - Cap. 24: Deslumbramento Pág. 196 / 1080

Mas Dantès recordou-se dos termos do testamento que sabia de cor: «No canto mais afastado da segunda abertura», dizia o documento.

Dantès penetrara apenas na primeira gruta; era necessário agora procurar a entrada da segunda.

Dantès orientou-se. A segunda gruta devia, naturalmente, penetrar no interior da ilha. Examinou os aglomerados de pedras e foi bater numa das paredes que lhe pareceu ser aquela onde se devia situar a abertura, disfarçada, sem dúvida, para maior precaução.

A enxada ecoou um instante, arrancando ao rochedo um som abafado. Continuou, mas a pedra era tão rija que a testa de Dantès se cobriu de suor. Por fim, pareceu ao mineiro perseverante que uma porção da muralha granítica respondia comum eco mais surdo e profundo ao apelo que lhe dirigiam.

Aproximou o olhar ardente da muralha e reconheceu, com o tacto do prisioneiro, o que talvez mais ninguém reconhecesse: que devia haver ali uma abertura.

No entanto, para não fazer um trabalho inútil, Dantès, que como César Bórgia estudara o valor do tempo, sondou as outras paredes com a enxada e o chão com a coronha da espingarda, cavou a areia nos sítios suspeitos e, não tendo encontrado nem reconhecido nada, tornou a atacar a porção da muralha que emitia o som animador.

Bateu de novo e com mais força.

Viu então uma coisa singular: que debaixo das pancadas do instrumento uma espécie de reboco, idêntico ao que se aplica nas paredes para pintar a fresco, se despegava e caía em palhetas, ao mesmo tempo que descobria uma pedra esbranquiçada e mole, semelhante às nossas vulgares pedras de cantaria. Fechara-se a abertura do rochedo com pedras de outra natureza e em seguida estendera-se sobre essas pedras uma camada de reboco, e por cima do reboco imitara-se a cor e o aspecto cristalino do granito.

Dantès atacou então a parede com a extremidade aguçada da enxada, que penetrou uma polegada na porta-muralha.

Era ali que se devia atacar.

Por um mistério estranho do comportamento humano, quanto mais as provas de que Faria se não enganara deviam, acumulando-se, tranquilizar Dantès, tanto mais o seu coração desfalecia e se entregava à dúvida e quase ao desânimo. Aquela nova experiência, que lhe deveria dar uma força nova, roubou-lhe a força que lhe restava. A enxada desceu e quase lhe escapou das mãos. Pousou-a no chão, enxugou a testa e saiu da gruta, dando a si mesmo o pretexto de ver se ninguém o espiava, mas na realidade porque necessitava de ar, porque sentia estar, prestes a desfalecer.

A ilha estava deserta e o Sol, no zénite, parecia cobri-la com o seu olho de fogo. Ao longe, barquitos de pescadores abriam as velas sobre o mar de um azul de safira.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069