O Conde de Monte Cristo - Cap. 48: Ideologia Pág. 476 / 1080

E ao pronunciar estas palavras, o olhar severo do magistrado nada perdera da sua arrogância habitual. As palavras que acabava de proferir articulara-as com a sua voz de procurador régio, com a mesma rigidez de pescoço e de ombros que, repetimos, levava os seus aduladores a dizer que ele era a estátua viva da Lei

- Senhor - replicou por seu turno o conde com uma frieza glacial -, sinto-me muito feliz por ter podido conservar um filho à sua mãe, pois diz-se que o sentimento da maternidade é o mais santo de todos, e a ventura que experimento dispensava-o, senhor, de cumprir um dever que me honra, sem dúvida, porque sei que o Sr. de Villefort não prodigaliza o favor que me faz, mas que, por mais precioso que seja, não vale no entanto para mim a minha satisfação íntima.

Villefort, surpreendido por esta tirada que não esperava, estremeceu como um soldado que sente debaixo da armadura que o cobre o golpe que lhe vibram, e uma franzidela desdenhosa de lábios indicou que desde o início não tinha o conde de Monte-Cristo na conta de um gentil-homem muito bem-educado.

Em seguida olhou à sua volta para ligar a qualquer coisa o diálogo caído e que ao cair parecia ter-se quebrado.

Viu o mapa que Monte-Cristo consultava quando ele entrara e perguntou:

- Ocupa-se de geografia, senhor? É um rico estudo, sobretudo para o senhor, que, ao que me afirmam, tem visitado tantos países quantos se encontram impressos nesse atlas.

- É verdade, senhor - respondeu o conde. - Pretendo fazer acerca do género humano, tomado em conjunto, o que o senhor pratica todos os dias a partir de excepções, isto é, um estudo fisiológico. Pensei que me seria mais fácil descer em seguida do todo para a parte do que da parte para o todo. Existe um axioma algébrico que aconselha a proceder do conhecido para o desconhecido e não do desconhecido para o conhecido... Mas sente-se, senhor, peço-lhe.

E Monte-Cristo indicou com a mão ao procurador régio uma cadeira, que este foi obrigado a dar-se ao incómodo de puxar pessoalmente para diante, enquanto o conde teve apenas de se sentar naquela em que estava ajoelhado quando o procurador régio entrara. Assim, o conde ficou semivoltado para o visitante, de costas para a janela e com o cotovelo apoiado na carta geográfica que era alvo, naquele momento, do diálogo, o qual tomava, como acontecera em casa de Morcerf e de Danglars, feição absolutamente análoga, senão quanto à situação, pelo menos quanto às personagens.





Os capítulos deste livro

Marselha - A Chegada 1 O pai e o filho 8 Os Catalães 14 A Conspiração 23 O banquete de noivado 28 O substituto do Procurador Régio 38 O interrogatório 47 O Castelo de If 57 A festa de noivado 66 Os Cem Dias 89 O número 34 e o número 27 106 Um sábio italiano 120 A cela do abade 128 O Tesouro 143 O terceiro ataque 153 O cemitério do Castelo de If 162 A Ilha de Tiboulen 167 Os contrabandistas 178 A ilha de Monte-Cristo 185 Deslumbramento 192 O desconhecido 200 A Estalagem da Ponte do Gard 206 O relato 217 Os registos das prisões 228 Acasa Morrel 233 O 5 de Stembro 244 Itália - Simbad, o marinheiro 257 Despertar 278 Bandidos Romanos 283 Aparição 309 A Mazzolata 327 O Carnaval de Roma 340 As Catacumbas de São Sebastião 356 O encontro 369 Os convivas 375 O almoço 392 A apresentação 403 O Sr. Bertuccio 415 A Casa de Auteuil 419 A vendetta 425 A chuva de sangue 444 O crédito ilimitado 454 A parelha pigarça 464 Ideologia 474 Haydée 484 A família Morrel 488 Píramo e Tisbe 496 Toxicologia 505 Roberto, o diabo 519 A alta e a baixa 531 O major Cavalcanti 540 Andrea Cavalcanti 548 O campo de Luzerna 557 O Sr. Noirtier de Villefort 566 O testamento 573 O telégrafo 580 Meios de livrar um jardineiro dos ratos-dos-pomares que lhe comem os pêssegos 588 Os fantasmas 596 O jantar 604 O mendigo 613 Cena conjugal 620 Projetos de casamento 629 No gabinete do Procurador Régio 637 Um baile de Verão 647 As informações 653 O baile 661 O pão e o sal 668 A Sra. de Saint-Méran 672 A promessa 682 O jazigo da família Villefort 705 A ata da sessão 713 Os progressos de Cavalcanti filho 723 Haydée 732 Escrevem-nos de Janina 748 A limonada 762 A acusação 771 O quarto do padeiro reformado 776 O assalto 790 A mão de Deus 801 Beauchamp 806 A viagem 812 O julgamento 822 A provocação 834 O insulto 840 A Noite 848 O duelo 855 A mãe e o filho 865 O suicídio 871 Valentine 879 A confissão 885 O pai e a filha 895 O contrato 903 A estrada da Bélgica 912 A estalagem do sino e da garrafa 917 A lei 928 A aparição 937 Locusta 943 Valentine 948 Maximilien 953 A assinatura de Danglars 961 O Cemitério do Père-lachaise 970 A partilha 981 O covil dos leões 994 O juiz 1001 No tribunal 1009 O libelo acusatório 1014 Expiação 1021 A partida 1028 O passado 1039 Peppino 1049 A ementa de Luigi Vampa 1058 O Perdão 1064 O 5 de Outubro 1069