Peppino fez um sinal, o rapaz estendeu as mãos e retirou rapidamente o frango. Danglars atirou-se para cima da sua cama de peles de bode, Peppino, voltou a fechar a porta e continuou a comer o seu grão com toucinho.
Danglars não podia ver o que fazia Peppino, mas o bater dos dentes do bandido não devia deixar ao prisioneiro qualquer dúvida acerca do exercício a que se dedicava.
Era evidente que comia; embora comesse ruidosamente e como um homem mal educado.
- Alarve! - gritou Danglars.
Peppino fez de conta que não ouvira, e sem sequer virar a cabeça continuou a comer com propositada lentidão.
Danglars tinha a sensação de ter o estômago furado como o tonel das Danaides e desconfiava que nunca o conseguiria encher.
No entanto, armou-se de paciência durante mais meia hora; mas é justo dizer que essa meia hora lhe pareceu um século.
Levantou-se e dirigiu-se de novo para a porta.
- Vejamos, senhor, não abusem mais tempo da minha paciência e digam-me imediatamente o que querem de mim
- Mas, Excelência, diga antes o que quer de nós... Dê-nos as suas ordens e cumpri-las-emos.
- Então abra primeiro.
Peppino abriu.
- Quero... - começou Danglars. - Irra, quero comer!
- Tem fome?
- Bem sabe que tenho.
- Que deseja comer V. Ex.a?
- Um naco de pão seco, visto os frangos serem demasiado caros nestes malditos subterrâneos.
- Pão? Seja - concordou Peppino. - Olá, pão! - gritou.
O rapaz trouxe um pãozinho.
- Pronto! - disse Peppino.
- Quanto? - perguntou Danglars.
- Quatro mil novecentos e noventa e oito luíses. Há dois luíses pagos adiantados.
- Como, um pão cem mil francos?...
- Cem mil francos - repetiu Peppino.
- Mas também me pediu cem mil francos por um frango!
- Nós não servimos à lista, mas sim a preço fixo. Quer se coma pouco, quer se coma muito, quer se peçam dez pratos, quer se peça só um, paga-se sempre o mesmo.
- Outra brincadeira! Meu caro amigo, declaro-lhe que tudo isto é absurdo, estúpido! Diga-me de uma vez que querem que morra de fome e acabaremos mais depressa.
- Mas não, Excelência! V. Ex.a é que se quer suicidar... Pague e comerá
- Pagar com quê, grande animal? - redarguiu Danglars, exasperado. - Julgas que alguém traz cem mil francos na algibeira?
- O senhor traz cinco milhões e cinquenta mil francos na sua, Excelência... - observou Peppino. - Isso dá para cinquenta frangos a cem mil francos e para meio frango a cinquenta mil...
Danglars estremeceu; a venda caiu-lhe dos olhos: continuavam a brincar com ele, mas finalmente compreendia a brincadeira.
E até de justiça que se diga que já a não achava tão chata como pouco antes.
- Vejamos, vejamos... Se lhes der os cem mil francos ficarei quite e poderei comer à minha vontade?