Jacopo deixou-se escorregar pela escotilha e voltou a subir pouco depois com as duas peças de roupa, que Dantès vestiu com indizível prazer.
- E agora, não precisa de mais nada? - perguntou o patrão.
- Um naco de pão e segunda golada desse excelente rum que já provei. Porque há muito tempo que não como nada.
Com efeito, havia quarenta e oito horas, aproximadamente.
Trouxeram a Dantès um naco de pão e Jacopo estendeu-lhe a garrafa empalhada.
- Leme a bombordo! - gritou o patrão, virando-se para o timoneiro.
Dantès deitou uma olhadela para o mesmo lado, levando a garrafa à boca, mas a garrafa ficou a meio caminho.
- Olhem! - exclamou o patrão. - Que se passa no Castelo de If?
Com efeito, uma nuvenzinha branca - nuvem que já atraíra a atenção de Dantès - acabava de aparecer coroando as ameias do bastião sul do Castelo de If
Um segundo mais tarde, o estampido de uma explosão longínqua veio morrer a bordo da tartana.
Os marinheiros ergueram a cabeça e entreolharam-se.
- Que significa aquilo? - perguntou o patrão.
- Deve ter fugido algum prisioneiro esta noite - informou Dantès - por isso disparam o canhão de alarme.
O patrão deitou uma olhadela ao rapaz, que ao mesmo tempo que dizia estas palavras levava a garrafa à boca. Viu-o, porém, a saborear o licor que ela continha com tanta calma e satisfação que, se teve qualquer suspeita, essa suspeita apenas lhe atravessou o espírito e morreu imediatamente.
- Irra, este rum é tremendamente forte! - exclamou Dantès, enxugando com a manga da camisa a testa coberta de suor.
- Seja como for - murmurou o patrão olhando-o -, se é ele, tanto melhor, pois adquiri um excelente homem.
A pretexto de estar cansado, Dantès pediu que o deixassem sentar-se ao leme. O timoneiro, encantado por ser substituído nas suas funções, consultou o patrão com a vista, o qual lhe acenou com a cabeça que podia entregar o leme ao novo companheiro.
Assim colocado, Dantès pôde ficar de olhos fixos para o lado de Marselha.
- A quantos do mês estamos hoje? - perguntou Dantès a Jacopo, que viera sentar-se junto dele, perdendo de vista o Castelo de If
- A 28 de Fevereiro - respondeu o interrogado.
- De que ano? - perguntou ainda Dantès.
- Como, de que ano?! Pergunta de que ano?
- Pergunto - insistiu o rapaz. - Pergunto de que ano.
- Esqueceu-se do ano em que estamos?
- Que quer, apanhei tamanho susto esta noite que quase perdi a cabeça e fiquei com a memória toda baralhada! Por isso lhe pergunto em 28 de Fevereiro de que ano estamos.
- Do ano de 1829 - respondeu Jacopo.