Quando se mostra a um amigo uma cidade já conhecida, põe-se nisso a mesma presunção que se usa para mostrar uma mulher de que se foi amante.
Nesta conformidade, Franz traçou ao cocheiro o itinerário: devia sair pela Porta del Popolo, seguir ao longo da muralha exterior e reentrar pela Porta de San-giovanni. Assim, o Coliseu aparecer-lhes-ia sem qualquer preparação e sem que o Capitólio, o Forum, o Arco de Séptimo Severo, o Templo de Antonino e Faustina e a Via Sacra servissem de degraus colocados no caminho para o encurtar.
Sentaram-se à mesa. Mestre Pastrini prometera aos seus hóspedes uma boa refeição. Deu-lhes um jantar razoável. Não havia nada a dizer.
Ele próprio apareceu no fim do jantar. Franz julgou a princípio que fosse para receber os seus cumprimentos e preparava-se para lhos dirigir quando ele o interrompeu às primeiras palavras.
- Excelência, estou lisonjeado com a sua aprovação, mas não foi para isso que cá vim...
- Foi para nos dizer que arranjou uma carruagem? - perguntou Albert, acendendo um charuto.
- Ainda menos, e até, Excelência, faria bem em não pensar mais nisso e tirar do caso o melhor partido. Em Roma, as coisas podem-se ou não se podem. Quando nos dizem que se não podem, acabou-se.
- Em Paris é mais cómodo: quando se não pode, paga-se o dobro e tem-se imediatamente o que se pretende.
- Tenho ouvido dizer isso a todos os franceses – redarguiu mestre Pastrini um bocadinho irritado -, o que me leva a não compreender por que motivo viajam.
- A verdade - disse Albert, expelindo fleumaticamente o fumo para o tecto, inclinando-se para trás e balouçando-se nas duas pernas de trás do cadeirão - é que são os loucos e os parvos como nós que viajam. As pessoas sensatas não saem do seu palácio da Rua do Helder, do Buievar de Gand e do Café de Paris.
Escusado será dizer que Albert residia na rua citada, dava todos os dias o seu passeio de bom-tom e jantava diariamente no único café onde se janta quando se está bem relacionado com os criados.
Mestre Pastrini ficou um instante silencioso. Era evidente que meditava a resposta, que sem dúvida não lhe parecia perfeitamente clara.
- Mas enfim - disse Franz por seu turno, interrompendo as reflexões geográficas do seu hoteleiro -, veio cá com qualquer finalidade. Quer expor-nos o objecto da sua visita?
- Tem razão. Ei-lo: mandaram vir a caleça às oito horas?
- Exactamente.
- Tencionam visitar il Colosseo?
- Quer dizer o Coliseu?
- É precisamente a mesma coisa.
- Seja.
- Disseram ao cocheiro para sair pela Porta del Popolo, dar a volta às muralhas e reentrar pela Porta de San- Giovanni?