«O homem que acompanhava Caderousse era evidentemente estranho ao Meio-Dia da França. Tratava-se de um desses feirantes que vêm vender jóias à feira de Beaucaire e que, durante o mês que dura a feira, aonde afluem vendedores e compradores de todas as partes da Europa, fazem às vezes cem ou cento e cinquenta mil francos de transacções.
«Caderousse entrou, apressado, à frente do outro. Depois, vendo a sala de baixo vazia, como de costume, e guardada apenas pelo seu cão, chamou a mulher:
«- Eh, Carconde! Aquele digno padre não nos enganou; o diamante é bom.
«Ouviu-se uma exclamação de alegria e quase imediatamente a escada estalou debaixo de passos pesados devido à fraqueza e à doença.
«- Que dizes? - perguntou a mulher, mais pálida do que uma morta.
«- Digo que o diamante é bom Aqui está este senhor, um dos primeiros joalheiros de Paris, que está pronto a dar-nos cinquenta mil francos por ele. Apenas, para ter a certeza de que o diamante é de facto nosso, deseja que lhe contes, como já lhe contei, de que forma miraculosa a pedra veio parar às nossas mãos. Entretanto, senhor, faça favor de se sentar, e como o tempo está carregado, vou buscar-lhe qualquer coisa para se refrescar. - O joalheiro examinava com atenção o interior da estalagem e a pobreza visível daqueles que lhe queriam vender um diamante que parecia saído do tesouro de um príncipe.
«- Conte, minha senhora - pediu, querendo sem dúvida aproveitar a ausência do marido para que nenhum sinal da parte dele influenciasse a mulher e para verificar se as duas histórias encaixavam bem uma na outra.
«- Meu Deus, foi uma bênção do Céu que estávamos muito longe de esperar! - disse a mulher, com volubilidade. - Imagine, meu caro senhor, que o meu marido conheceu em 1814 ou 1815 um marinheiro chamado Edmond Dantès. Esse pobre rapaz, que Caderousse esquecera por completo, não o esqueceu a ele e deixou-lhe ao morrer o diamante que o senhor acaba de ver.
«- Mas como se tornou ele possuidor do diamante? - perguntou o joalheiro. - Já o tinha antes de ser preso?
«- Não, senhor - respondeu a mulher. - Mas parece que conheceu na prisão um inglês muito rico, e como na prisão o seu companheiro de cela adoeceu e Dantès o tratou como se fosse seu irmão, o inglês, ao sair do cativeiro, deixou ao pobre Dantès, que, menos feliz do que ele, morreu na prisão, esse diamante que ele nos legou por seu turno ao morrer e que encarregou o digno abade que cá esteve esta manhã de nos entregar.